Sob o meu olhar

Aqui neste blog, vocês poderão ver, ler e comentar a respeito do que escreverei. Por meio deste meu olhar sincero, tentarei colocar artigos e dar minha opinião sobre questões atuais como politica, problemas sociais, educação, meio ambiente, temas que tem agitado o mundo como um todo. Também escreverei poesias e colocarei poemas de grande poetas que me afloram a sensibilidade, colocarei citações e frases pequenas para momentos de reflexão.
É desta forma que vou expor a vocês o meu olhar voltado para o mundo.

31/10/2011

Minha Homenagem a Carlos Drummond de Andrade pelo seu Aniverário


Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Blog Limpinho e Cheiroso: Câncer de Lula: Os sobrinhos do Rafinha Bastos e os escrotos da internet

Blog Limpinho e Cheiroso: Câncer de Lula: Os sobrinhos do Rafinha Bastos e os escrotos da internet

29/10/2011

A Líbia que eu conheci (Georges Bourdoukan)




Sexta, 28 de Outubro de 2011




Parte 1

Estive na Líbia em setembro de 1979, por ocasião do décimo aniversario da Revolução que levou Kadafi ao poder.

Me acompanharam na ocasião o cinegrafista Luis Manse e o operador de Nagra Nelson Belo, Belo (por onde andarão?).

Estávamos ali pelo Globo Repórter, do qual eu era o diretor em São Paulo.

Primeira surpresa. O hotel, para onde o governo nos enviou, estava totalmente ocupado por diplomatas.

Perguntei ao embaixador do Brasil a razão dessa concentração.

A resposta me surpreendeu ainda mais.

Na Líbia de Kadafi, os aluguéis estavam proibidos.

Aos líbios que não tivessem casa, era só solicitar que o governo imediatamente providenciava a construção de uma.

O país era um imenso canteiro de obras.

E mais: Uma lei em vigor, A LEI DO COLCHÃO, determinava que, qualquer cidadão líbio que soubesse da existência de casa alugada, era só atirar um colchão no quintal que a casa passava a ser sua.

Inúmeras embaixadas sofreram com essa lei já que foram ocupadas por líbios.

O próprio embaixador me contou na ocasião que a embaixada brasileira não ficou imune a essa lei.

Um motorista líbio que ali trabalhava informou a um amigo que ainda não tinha casa, que a embaixada do Brasil era alugada.

Imediatamente esse amigo atirou um colchão e reivindicou a propriedade (uma mansão que pertencia a um italiano que retornou à Itália apos a subida ao poder de Kadafi).

O governo líbio precisou intervir para evitar maiores dissabores.

O Brasil acabou ganhando a embaixada e o líbio uma casa nova.

Isto tudo aconteceu na década de 70, quando a Líbia era uma potência riquíssima, com apenas 3 milhões de habitantes, em quase 1.800.000 quilômetros quadrados.

Os líbios, por lei, eram proibidos de trabalhar como empregados de estrangeiros.

O líbio que não quisesse trabalhar recebia o equivalente, valores de hoje, a cerca de 7 mil dólares por mês.

E mais: médico, hospital e remédios era tudo de graça.

Ninguém pagava escola e o líbio que quisesse aperfeiçoar seus estudos fora do país ganhava uma substancial bolsa.

Conheci muitos desses líbios na França, Itália, Espanha e Alemanha, e outros países onde estive como jornalista.

Parte 2


Estamos em Trípoli, ano 1979.

Esta noite quase não consegui pegar no sono.

No hotel onde estava hospedado, alem dos diplomatas e alguns jornalistas, estavam também delegações de países africanos de língua portuguesa.
Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, etc.

E foram eles que não me deixaram pegar no sono já que, sabendo que eu teria um encontro com Kadafi no dia seguinte, queriam que eu lhe pedisse mais explicações sobre o socialismo Líbio.

Disseram que nunca haviam visto algo igual. Nem mesmo em livros.

Ficaram admirados com a Lei do Colchão (veja post abaixo), com a assistência médica, remédios e educação, tudo gratuito.

E pelo fato de ninguém ser obrigado a trabalhar na Líbia e mesmo assim receber uma remuneração “ fantástica” no dizer de um angolano.

Prometi que tentaria obter uma resposta, desde que, de fato, eu conseguisse falar com Kadafi, por saber que ele era imprevisível e não poucas vezes deixou jornalistas aguardando ad infinitum.

Antes, preciso esclarecer que as portas dos apartamentos dos hotéis não possuíam fechaduras.

Por isso todos podiam entrar no apartamento de todos razão pela qual nossos apartamentos eram sempre “visitados”.

Perguntei ao gerente do hotel a razão da falta de fechaduras.

Respondeu que na Líbia não havia ladrões como na “época da colonização italiana e por isso as fechaduras eram prescindíveis”.

Mas um diplomata me esclareceu que a falta de fechaduras era para que os “fiscais” do governo pudessem entrar a qualquer hora do dia ou da noite para ver se não havia mulheres “convidadas” nos apartamentos.

“Porque, prosseguiu o diplomata, os líbios até hoje falam que durante a colonização italiana e o reinado de Idris, os hotéis serviam apenas para orgias”.

No dia seguinte me preparo para o encontro com Kadafi.

Manse, com a sua câmera e Belo com seu gravador Nagra me aguardavam ao lado do elevador.

Com cara de sono, reclamaram que seus apartamentos foram “penetrados” umas três vezes de madrugada e foi um susto só.

O carro enviado pelo governo nos esperava na entrada, mas Manse queria tomar mais um cafezinho.

Entrei no carro e aguardei.

Cinco minutos depois Luis Manse, com sua inseparável câmera, chegava sozinho.

Perguntei pelo Belo, ele disse que o imaginava comigo.

Perguntei ao nosso acompanhante se ele havia visto o nosso companheiro.

Imediatamente ele foi à portaria perguntar.

Um rapaz simpático respondeu que tinha visto Belo acompanhado por dois policiais uniformizados a caminho da praça que ficava a uns cinqüenta metros do hotel.

Fiquei preocupado, imaginando o pior.

Jornalista acompanhado por policiais no Brasil nunca era um bom augúrio.

Parte 3


Belo e os dois policiais estão parados ao lado de um reluzente carro Mercedes Benz novinho em folha.

Perguntei o que estava acontecendo.

Um dos policiais me disse que o meu companheiro não parava de apontar a chave do carro na ignição. E que eles não sabiam a razão, pois Belo não falava o árabe e nem eles o “brasileiro”.

Então era por isso que eles saíram juntos do hotel.

Nada preocupante.

Belo me explicou e eu traduzi para o policial que ele, ao ver a chave na ignição, ficou preocupado de alguém roubar o carro.

Os dois policiais começaram a rir e disseram tratar-se de um carro abandonado.

Era um costume no país.

Quem não gostasse do carro bastava abandoná-lo com a chave dentro. O interessado podia levá-lo.

Essa era a Líbia da época.

Muita fartura, nenhuma miséria e a abundância ao alcance de todos.

Alias isso podia se observar nas pessoas.

Os mais velhos, que viveram sob o domínio dos colonialistas e durante a monarquia, eram pessoas alquebradas, corpo seco.

As crianças e os jovens eram saudáveis e alegres.

Só para se ter uma idéia da Líbia sob Kadafi, tudo custava mais ou menos o equivalente a 3 dólares.

Havia supermercados gigantescos, mas nada era vendido a varejo.

Quem quisesse arroz, por exemplo, pagava 3 dólares pelo saco de 50 quilos.

Tudo era nessa base.

Fomos visitar o parque industrial de Trípoli e eu pedi para conhecer uma tecelagem.

Perguntei como era a relação com os clientes e um técnico alemão que ali se encontrava para montar o maquinário, começou a rir.

“Os líbios são loucos”, me disse. E completou: “eles não vendem nada aqui por metro, somente a peça inteira. E para qualquer um que entrar na fábrica e pedir”.

Perguntei o preço da peça: 3 dólares a peça de 50 metros...

Mas se você, por exemplo, quisesse comprar uma gravata, qualquer uma, o preço mínimo era o equivalente a 200 dólares.

Um cachimbo, 300 dólares.

Ou seja, todo produto que lembrasse os colonizadores e, de acordo com eles, representasse ou sugerisse consumo supérfluo, era altamente taxado.

Bebida alcoólica, nem pensar. Dava prisão sumária.

E foi o que aconteceu com dois jornalistas argentinos, cuja “esperteza” os remeteu ao porto e ali compraram de um cargueiro uma garrafa de uísque.

Um dos funcionários do hotel sentiu o bafo e os denunciou.

É verdade que eles não foram presos, porque eram convidados do governo.

Mas não puderam entrevistar ninguém, muito menos o Kadafi...

E nós só soubemos disso porque o embaixador do Brasil, uma figura simpaticíssima, uma noite nos convidou para a Embaixada e, ali, nos ofereceu um uísque de não sei quantos anos (guardado a sete chaves num cofre), que Manse e Belo acharam delicioso.

Claro que eu também bebi um gole, apesar de detestar uísque.

Seja de que marca for, de que ano for.

Sempre me lembrou o gosto de iodo.

Evidentemente não faria uma desfeita ao embaixador tão solícito.

Não estalei a língua porque aí seria demais.

Antes de nos despedirmos, o embaixador nos ofereceu um litro de leite para cada um, pois segundo ele o leite disfarçaria o nosso hálito.

Na porta, perguntei ao embaixador se ele poderia nos dar um depoimento.

“O Kadafi é um Gênio”, respondeu.

Surpreso, perguntei.

O senhor considera o Kadafi um Gênio?

Sim! Um Gênio!

Parte 4



Então o senhor considera Kadafi um Gênio?

Sim! Respondeu o embaixador. Um Gênio! E amanhã o senhor vai ter uma prova disso.

Não entendi.

Amanhã vai haver um desfile em comemoração ao décimo aniversario da Revolução. Assista e veja se não tenho razão.

O dia seguinte amanheceu glorioso. E eu já estava preocupado.

Se o país vai parar para comemorar o décimo aniversário da Revolução, será que Kadafi vai encontrar tempo para a entrevista?

A população lotava a praça e as ruas onde seriam realizados os desfiles.

Um fato me chamou a atenção.

Havia milhares de meninas adolescentes com uniformes militares prontas para o desfile.

Sorriam um sorriso que somente as adolescentes possuem.


Impressionante a sua alegria.

Foi assim que Kadafi libertou as mulheres, que antes não podiam atravessar a porta de casa e nem tirar as vestimentas que cobriam seu corpo de cima abaixo, me confidenciou o embaixador.

É ou não um gênio?

Essas adolescentes saem de casa bem cedinho usando o uniforme militar e retornam para suas casas no fim do dia. Elas só não dormem no quartel.

E têm autorização para não tirar o uniforme.

Depois do serviço militar elas jamais voltam a se vestir como anteriormente.

Então é por isso que as mulheres líbias se vestem como as ocidentais?

Mas vez ou outra deparamos com mulheres com roupas tradicionais.

Terminado o desfile, um membro do governo me diz que Kadafi nos receberia não mais em Trípoli, mas em Benghazi, a bela cidade mediterrânea.

E que nos buscariam de madrugada pra viajarmos os 600 quilômetros que separam as duas cidades.

Fico sabendo nesse dia que a energia elétrica que ilumina o país é de graça.

Ninguém recebe a conta de luz, seja em casa ou no comércio.

E quem tiver aptidão para empresário, pode buscar os recursos necessários no banco estatal e não paga nenhum centavo de juros.

A divisão da riqueza do país com sua população, em nome do islamismo, criou um sério problema para os demais países muçulmanos, principalmente Arábia Saudita.

E desde então, Kadafi nunca poupou os dirigentes sauditas que acusou de terem se apossado de um país que jamais lhes pertenceu e de serem “infiéis que conspurcavam o verdadeiro islamismo”.

“Trocaram o Profeta pelo petróleo”.

Pela primeira vez usava-se o Alcorão contra aqueles que se diziam seus defensores.

Os sauditas, acuados, só conseguiam dizer que ele era “comunista”.

Kadafi respondia que ele apenas seguia o Alcorão ao pé da letra.

Várias revoltas começaram a eclodir na Arábia Saudita e países do Golfo.

Estados Unidos e mídia associada começaram a arregaçar as mangas.

Era preciso defender a vassala Arábia Saudita e transformar Kadafi num pária.

Na volta ao hotel, dou de cara com revolucionários da África do Sul. Estavam na Líbia em busca de fundos para lutar contra o apartheid.

Parte 5


Vamos falar francamente.

Eu estava me esforçando para realizar um programa que dificilmente seria exibido.

Naquela época o Globo Repórter registrava uma audiência enorme, entre 50 e 65, com pico de 72.

Alem do mais, vivíamos sob o tacão da ditadura.

Mas já que estávamos lá, vamos tocar o barco e ver no que vai dar.

À noite, no hotel, alguém abre a porta e me pergunta se posso conversar um pouco.

Era o chefe da delegação de Guiné-Bissau e estava empolgado. Nunca imaginara conhecer um país como a Líbia.

Perguntou como foi o meu encontro com Kadafi.

Respondi que o encontro seria no dia seguinte em Benghazi.

Enquanto conversávamos, um “fiscal” do governo, entra no quarto e nos cumprimenta sorridente.

Dá uma olhada rápida e com aquele sorriso de comissária de bordo, nos agradece e vai embora.

Mal passaram 10 minutos e a porta novamente é aberta. Um jornalista do Rio de Janeiro, meu vizinho de quarto entra desesperado.

- Uma coca cola pelo amor de Deus. Meu reino por uma coca-cola. Vou descer até saguão, alguém precisa me informar onde consigo comprar coca cola nesse país de birutas.

E nem esperou o elevador. Desceu pela escada mesmo.

- Maluco esse seu vizinho, me confidenciou o guine-bissauense( é assim mesmo que se diz?). E alem do mais ainda ofendeu Shakespeare.

Em seguida ele me revela que conheceu muitos revolucionários de países diferentes que se encontravam na Líbia em busca de recursos.

Inclusive sul-africanos.

- Entregaram uma carta de Nelson Mandela para o Kadafi pedindo para ele não esquecer seus irmãos africanos, respondeu feliz, dando a entender que eles foram atendidos.

Novamente o “fiscal” com sorriso de comissária de bordo entra. Desta vez para nos convidar a assistir no salão do hotel a um filme sobre os “horrores” da herança colonialista.

Na verdade não era um filme, mas um documentário de 15 minutos e se a idéia era para que a platéia se indignasse, o efeito foi o contrário.

O documentário mostrava a noite em Trípoli. Garotas seminuas andando nas ruas em busca de clientes, “inferninhos”, cabarés, bebidas alcoólicas, muitas bebidas, e por aí vai.

E o pior, terminada a exibição vários aplausos da platéia, principalmente de jornalistas, pedindo a volta dos colonizadores...

Isso sim é que era época boa, exclamou o jornalista carioca, agora ao lado de um colega mineiro que completou: “eta paizinho que nem coca-cola tem”.

Quatro da manhã somos acordados. Do aeroporto de Trípoli seguimos para Benghazi, onde finalmente vamos entrevistar Kadafi.

Parte 6


Quando desembarcamos em Benghazi, a belíssima Benghazi, tamareiras enfeitavam suas praias.

Estavam ali como os coqueiros nas praias do nordeste.

Era colher e comer tâmaras dulcíssimas.

Um jornalista suíço que chegara a Benghazi uma semana antes, me confidenciou que não deveria perder um casamento. Qualquer um, disse.

Estava realmente deslumbrado com a festa e o que o deixou mais impressionado, é que os noivos, depois da cerimônia, recebem um envelope do governo com o equivalente a 50 mil dólares de presente.

Bem, essa era a Líbia que pouca gente conhecia e a mídia ocidental não fazia nenhuma questão de mostrá-la.

E não poderia, pois como explicar a seus leitores que havia ascendido ao poder um jovem coronel que não utilizou a riqueza em benefício próprio?

Pelo contrário.

Havia dividido a riqueza com a população do país.

Que não queria ver ninguém sem teto, sem fome, sem educação e sem muitas outras coisas mais.

Eu, naturalmente, iria sem dúvida nortear a minha entrevista a partir desses pontos.

Mas antes da entrevista, fomos a três festas com músicos árabes de diversos países.

E haja doce.

E haja suco.

E nem um “uisquinho”, lamentavam alguns jornalistas que, sinceramente, acho que estavam no país sem saber porque e para que.

As festas corriam em tendas beduínas, algo que Kadafi sempre prezou.

Finalmente cara a cara com Kadafi.

Em sua tenda.

Aparentava cansaço.

Alguns dos assuntos discutidos:

1-Socialismo líbio;
2-Educação;
3-Reforma agrária;
4-Moradia
5-Alinhamento
6-Arabismo
7-Socialismo chinês, soviético, cubano;
8-Apoio aos movimentos revolucionários;
9-Che Guevara;
10-Estados Unidos;
11-Brasil;
12-liberação feminina
13-Reencarnação de Omar Moukhtar.

A entrevista, que seria de 40 minutos, durou mais de duas horas e creio que passaríamos a noite conversando se ele não fosse a toda hora solicitado.

Naturalmente a Globo achou melhor não colocar o programa no ar, pois poderia melindrar a ditadura.

Foi feita uma proposta para que um programa de 15 minutos fosse ao ar no Fantástico.

Foi realizada a reedição, mas o programa teria sido proibido pelos censores oficiais da ditadura (civil-militar-midiática).

Tudo culpa da ditadura.

Será?

Oh, céus! Oh, terra! Quando nos livraremos desse sistema putrefato?

A Líbia que eu conheci – Final
Qual foi o grande erro de Kadafi?

Eu não tenho a menor dúvida.

Foi acreditar nos euro-estadunidenses e desistir de sua bomba atômica.

Os pacifistas que me perdoem.

Aqui não se trata de incentivar a produção de ogivas nucleares, mas de persuasão.

O Brasil que tome jeito e comece a produzir a sua.

Caso contrário, a própria mídia brasileira, associada ao Império, fará de tudo para que o país seja invadido e ocupado.

Kadafi não ficou rico, como os produtores de petróleo do Golfo.

Dividiu a riqueza do país com a população.

Apoiou todos os movimentos revolucionários de esquerda do mundo.

Inclusive os brasileiros.

Em nenhum momento esqueceu a população negra da África.

E da África do Sul, onde, em agradecimento, um neto de Nelson Mandela chama-se Kadafi.

Quando Nelson Mandela tornou-se o primeiro presidente da África do Sul em 1994, o então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, fez de tudo para que Mandela parasse com os agradecimentos quase diários a Kadafi pelo seu apoio à luta dos revolucionários africanos.

"Os que se irritam com nossa amizade com o presidente Kadafi podem pular na piscina", respondeu Mandela.

O presidente de Uganda Yoweri Museveni afirmou que "quaisquer que sejam as falhas de Kadafi, ele é um verdadeiro nacionalista. Prefiro nacionalistas do que marionetes de interesses estrangeiros".

E disse mais:

" Kadafi deu contribuições importantes para a Líbia, para a África e para o Terceiro Mundo. Devemos lembrar ainda que, como parte desta forma independente de pensar, ele expulsou bases militares britânicas e americanas da Líbia após tomar o poder".

Alem disso, o ex-líder líbio também teve papel importante na formação da União Africana (UA).

A principal coordenadora da guerra contra a Líbia, Hillary Clinton, andou pela África pregando abertamente o assassinato de Muammar Kadafi.

Como não teve sucesso, começou a recrutar mercenários.

Alias foram esses mercenários, inclusive os esquadrões da morte colombianos, que lutaram na Líbia. E eles não foram dizimados graças à Organização Terrorista do Atlântico Norte (OTAN) e EUA.

Quem puder pesquisar, quando Kadafi nacionalizou as empresas petrolíferas e os bancos, a mídia Ocidental referia-se a ele como Che Guevara Árabe.

Antes de ser deposto e linchado pelos mercenários a mando dos terroristas OTAN e EUA, a Líbia possuía o maior índice de desenvolvimento humano da África, e até hoje maior que o do Brasil.

E o que pouca gente sabe, em 2007 inaugurou o maior sistema de irrigação do mundo.

Transformou o deserto (95% da Líbia) em fazendas produtoras de alimentos.

Alias, assim que subiu ao poder os líbios que quiseram produzir alimentos receberam terra, equipamentos, sementes e 50 mil dólares para sobreviver até a safra.

Foi uma Reforma Agrária total e irrestrita.

Ele também pressionou pela criação dos Estados Unidos da África (EUA) para rivalizar com os EUA e união européia.

Ele lutou por uma África una: “Queremos militares africanos para defender a África. Queremos uma moeda única. Queremos um só passaporte africano".

Lamentavelmente esqueceu a Bomba Atômica. E pagou por isso.

As nações que querem se emancipar que pensem nisso.

E abaixo você ouve os presidentes Hugo Chaves, Evo Morales, Rafael Correa e Fernando Lugo... cantando Hasta Siempre, em homenagem a Che Guevara. Eles também que se cuidem.

28/10/2011

Orgulho de ser PCdoB (Luciano Siqueira)

Na história institucional brasileira sinuosa tem sido a trajetória dos partidos políticos. Não apenas no Império e na República Velha, quando quase inexistia prática democrática, mas mesmo após a Revolução de 30, quando se desencadeou um período de transformações significativas na sociedade.


Entretanto, os longos interregnos autoritários que se sucederam entre 30 e 85 – sobretudo o Estado Novo e a Ditadura Militar – significaram enorme obstáculo à construção de partidos consistentes e estáveis.

O fato é que sempre predominaram, em nosso País, agremiações partidárias efêmeras, conjunturais e frágeis. Mesmo partidos que se organizaram retomando siglas existentes em situações passadas, o fizeram sem coerência com a linha e a feição política de antes.

O Partido Comunista do Brasil se distingue, dentre todos, por se manter há 89 anos atuante e presentes em todas as lutas importantes de caráter popular e democrático de nossa história recente. Em que pesem a perseguição policial, a interdição legal e a carga de preconceitos que por durante muito tempo pairaram sobre si, o Partido foi capaz de sobreviver, crescer e conquistar papel indispensável na cena política.

Isto porque aliou fidelidade à base teórica e ideológica em que se funda – o marxismo-leninismo – o empenho permanente em ligar-se ao povo. Evoluiu teórica e politicamente. Alcançou a maturidade. Hoje ostenta um Programa Socialista a um só tempo cientificamente lastreado e consentâneo com as peculiaridades da realidade brasileira.

Também contribuiu e contribui para a existência exitosa do PCdoB a sua têmpera militante. Nesses quase 90 anos, milhares dos melhores filhos do povo fundiram seu destino pessoal ao projeto partidário e nacional. Foram capazes de lutar sob as mais adversas condições, inúmeros pagando com a própria vida pela fidelidade à causa que abraçaram.

É esse Partido, assim temperado no transcurso de batalhas históricas e atuais, que enfrenta no presente momento agressiva e odiosa campanha visando a denegri-lo. O combate que se trava através da grande mídia, feita porta-voz da direita mais abjeta, contra o ex-ministro Orlando Silva busca precisamente o impossível: abater, enfraquecer e derrotar o PCdoB. Mas encontra nos comunistas uma fortaleza unida, determinada e amplamente respaldada pelos aliados e pelo prestígio conquistado junto a crescentes parcelas dos trabalhadores e do povo.

O PCdoB resiste com altivez e mais uma vez vencerá, pois – como dizia João Amazonas – “é a consciência e a honra da nação”.

NAS DEMOCRACIAS CONTEMPORÂNEAS, CONSCIÊNCIA DE RENDA SE TORNA MUITO MAIS IMPORTANTE DO QUE A CONSCIÊNCIA DE CLASSE

A consciência de renda e a geografia urbana

Vivemos um momento histórico e sem precedentes. Grandes países do mundo todo, de todos os continentes, estão com democracias consolidadas e em processo de consolidação. Europa, América do Norte, Oceania, América Latina, África e Ásia.

Mas essas democracias sofrem de um grande problema: a consolidação de uma “classe de poder” com o poder e os recursos econômicos da sociedade. Nessa nova classe rica há de tudo: capitalistas (da indústria, das finanças e do comércio, que são seus grandes financiadores), mas também há sindicalistas, políticos,  jornalistas,  trabalhadores, desembargadores, comunistas, socialistas etc. É a opulência da modernidade que substitui a consciência de classe, como definido pela sociologia.

A evidência dessa consolidação de uma classe rica das democracias (uma classe de poder) que traz em si essa diversidade que dificulta profundamente os caminhos utópicos em busca das transformações sociais, da diminuição da desigualdade, da consolidação de sociedades estáveis e de bem estar social para toda a população.

Apesar da boa condição econômica da Europa e dos Estados Unidos, são exatamente nesses países que se verifica pouca ou nenhuma mudança com a alternância de poder dentro das democracias. A política do direitista se difere pouco da política do esquerdista. Os comunistas ficaram ricos, os socialistas estão endinheirados, os sindicalistas estão abonados.

Há uma certa acomodação generalizada que solidifica uma dificuldade muito maior para se compreender a sociedade do que o conceito do trabalho e classes sociais. Uma cena sintomática da nova realidade foi ver  o deputado comunista Aldo Rebelo em visita ao aniversário de 80 anos de Paulo Maluf. Esse é o novo símbolo da democracia contemporânea, a civilidade das ideologias. O trabalho se torna cada vez mais inconsistente para os marxistas.

Qual a diferença estrutural entre os socialistas e os liberais da Europa? O que diferencia Obama e de Bush? Qual a diferença entre o partido trabalhista inglês e o conservador? Praticamente são as mesmas políticas. Durante as eleições de Lula se ensaiou uma discussão entre ricos e pobres. Apesar das diferenças entre os  governos de FHC e Lula não serem muito radicais, um país como o Brasil - com tamanha desigualdade – permitiu uma mudança de foco no governo Lula que deu dinamismo à sociedade. Isso fez com que durante as eleições houvesse intensa discussão sobre o pobre o o rico, que se arrefeceu após a eleição.

Essa é na verdade a consciência mais revolucionária que pode existir nas democracias representativas contemporâneas. Veja, nem aqui e nem em lugar nenhum do mundo o rico paga imposto e, se paga, paga a mesma proporção que o cidadão de classe média e pobre. Há uma interdependência mais radical e proeminente entre o grupo rico (do poder) e os pobres (sociedade)  atualmente do que a interdependência entre capital e trabalho. Faz-se necessário à sociologia o desenvolvimento de teoria marxista da renda fundada em conceitos extraídos das relaçõs sociais presentes nas democracias representativas contemporâneas. A consciência de renda parece trazer à tona as estruturas escondidas na legalidade dessas democracias.

25/10/2011

Kadafi e a putrefação moral do império - Atilio Boron




 
24 de Outubro de 2011

O brutal assassinato de Muammar Kadafi pelas mãos de uma matilha de mercenários organizados e financiados pelos governos “democráticos” dos Estados Unidos, França e Reino Unido atualiza dolorosamente o vigor de um velho aforismo: “socialismo ou barbárie”.

Não só isso: também confirma outra tese, ratificada vez por outra, apoiada em que os impérios decadentes procuram reverter o veredicto inexorável da história exacerbando sua agressividade e atropelos em meio a um clima de insuportável decomposição moral. Ocorreu com o império romano, depois o espanhol, mais tarde o otomano, depois o britânico, o português, e hoje acontece com os estadunidenses.

Não é outra a conclusão que se pode tirar olhando os numerosos vídeos que ilustram a forma pela qual se “fez justiça” com Kadafi, algo que desqualifica irreversivelmente aqueles que se reivindicam a condição de representantes dos mais elevados valores da civilização ocidental. Sobre esta, caberia recordar a resposta dada por Mahatma Gandhi à pergunta de um jornalista, interessado em saber a opinião do líder asiático sobre o assunto: “é uma boa idéia”, respondeu, sarcasticamente.

O imperialismo precisava de Kadafi morto, tal qual Bin Laden. Vivos eram um perigo imediato, porque suas declarações em foros judiciais já não seriam tão fáceis de esconder da opinião pública mundial, como no caso de Saddam Hussein. Se Kadafi falasse, poderia ter feito espetaculares revelações, confirmando numerosas suspeitas e envolvendo muitas instituições que poderiam ter sido documentadas contundentemente pelo líder líbio, oferecendo nomes de testas de ferro imperiais, dados de contratos, comissões, subornos pagos a administradores, contas nas quais se depositaram fundos milionários e muito mais.

Poderíamos vir a saber o que os Estados Unidos lhe ofereceram em troca de sua suicida colaboração na “luta contra o terrorismo”, que permitiu que na Líbia se torturasse suspeitos que Washington não poderia atormentar nos EUA. Teríamos também descoberto quanto dinheiro entrou na campanha presidencial de Sarkozy e o que houve em troca; quais foram os termos do acordo com Tony Blair e a razão pela qual fez doações tão generosas à London School of Economics; como se organizou o tráfico de jovenzinhas para o decrépito fauno italiano, Silvio Berlusconi, entre tantas e tantas coisas. Por isso era preciso calá-lo, como fosse possível.

O último Kadafi, o que se jogou nos braços imperialistas, cometeu uma sucessão de erros impróprios a alguém que já vinha exercendo o poder durante 42 anos, sobretudo quando se tem em conta que o poder ensina.

Primeiro erro: acreditar na palavra dos líderes ocidentais, mafiosos do colarinho branco em quem jamais se pode acreditar, apesar de seus traços individuais – frágeis, salvo exceções -, pois são a personificação de um sistema intrinsecamente imoral, corrupto e irreformável. Teria caído bem a Kadafi lembrar aquela frase de Che Guevara, quando dizia que “não se pode confiar no imperialismo nem um tantinho assim, nada!”.

E ele confiou. E ao fazê-lo cometeu o segundo erro: desarmar-se. Se os canalhas da OTAN puderam bombardear a bel prazer a Líbia foi porque Kadafi desarticulou seu sistema de defesa anti-aérea e já não possuía mísseis terra-ar. “Agora somos amigos”, lhe disseram Bush, Obama, Blair, Aznar, Zapatero, Sarkozy, Berlusconi, e ele acreditou.

Terceiro erro: esquecer que, como lembra Noam Chomsky, os Estados Unidos só atacam a rivais frágeis, indefesos, ou que considerem assim. Por isso conseguiu atacar o Iraque, quando este já estava destroçado pela guerra contra o Irã e os longos anos de bloqueio. Por isso não ataca Cuba, porque de acordo com os próprios informes da CIA, ocupar militarmente a ilha custaria um mínimo de 20 mil mortos, preço alto demais para qualquer presidente.

Os imperialistas negaram a Kadafi o que concederam aos grandes comandantes nazistas que aniquilaram seis milhões de judeus. Seus crimes foram mais monstruosos que as atrocidades nazistas? O procurador geral do Tribunal Penal Internacional, Luis Moreno Ocampo, finge que não vê, quando deveria iniciar um processo contra o chefe da OTAN, causadora de cerca de 70 mil mortes de civis líbios. Em uma mostra de repugnante putrefação moral, a Secretária de Estado Hillary Clinton celebrou com sorrisos e uma piada a notícia do assassinato de Kadafi.

Um pouco mais cautelosa foi a reação do Tio Tom (o escravo negro aburguesado que pensa e atua em função dos seus amos brancos) que habita a Casa Branca, mas que já há algumas semanas havia se mostrado comprazido pela eficácia da metodologia ensaiada na Líbia, a mesma que, advertiu, poderia ser aplicada a outros lideres não dispostos a lamber as botas do Tio Sam.

Essa vitória ocasional, prelúdio de uma infernal guerra civil que comoverá a Líbia e todo o mundo árabe em pouco tempo, não deterá a queda do império. Enquanto isso, como observa o agudo filósofo italiano Domenico Losurdo, o crime de Sirte evidenciou algo impensável até pouco tempo atrás: a superioridade moral de Kadafi em relação aos carniceiros de Washington e Bruxelas. Disse que lutaria até o fim, que não abandonaria o povo e cumpriu sua palavra. Com isso dá e sobra para se colocar acima de seus algozes.

"Parábola de Buda sobre a casa em chamas” - B. Brecht

Buda conta a seus discípulos uma história:

“Numa ocasião, vi uma casa pegando fogo.

As chamas saíam pelo telhado.

Quando me aproximei, vi homens em seu interior.

Avisei que o teto estava queimando,

Mas não tinham pressa.

Um deles, enquanto suas sobrancelhas começavam a arder,

Perguntou-me como estava o tempo aqui fora, se a chuva continuava,

Se a ventania parara, se havia outra casa nas redondezas e assim por diante.

Não respondi e me afastei.

Na realidade, meus amigos, aos indiferentes que não vêem motivos para mudar

Não tenho nada a dizer”.

Em busca de uma praça Tahrir universal contra o capitalismo - Eduardo Febbro


A crueza brumosa e úmida do outono não os dissuadiu. Apenas terminou a marcha mundial dos indignados de 15 de outubro, os indignados ingleses seguiram ou exemplo de Nova York e Madri. As 150 barracas nas que se instalaram na parte externa da Catedral San Pablo de Londres suscitam olhares de ironia dos elegantes transeuntes que circulam por esta zona da capital inglesa. San Pablo é a ante-sala ao coração da “City”, ao antro das finanças mundiais contra as quais os membros do Occupy London Stock Echange se manifestam.

”Com o passar dos dias fomos nos organizando. Faz frio, muita gente nos olha com ironia mas também há muita solidariedade de outros passeantes”, relata Danielle Allen, uma professora de 25 anos, sem trabalho, que descobre pela primeira vez a ação social em plena rua. ”Capitalisme is crisis”, diz uma bandeirola desfraldada na explanada da catedral. O quadro é insólito: cavalheiros famélicos, trajados como lordes caminham entre as barracas do acampamento com ar de atravessar um jardim. Os jovens que montaram as barracas obtiveram uma vitória, por mais passageira que fosse. Com a benção do Reverendo Giles Frases transformaram este centro mundial das finanças em sua moradia sem que, até agora, a polícia os forçasse a partir. Instalaram banheiros móveis, uma “barraca cozinha”, uma “barraca enfermaria”, outra que funciona como um jardim de infância e uma onde se realizam oficinas de todo tipo.

Odiados e odiadores se cruzam às vezes com interesse, outras com uma indiferença de seres invisíveis. À hora do almoço, muitos dos empregados da City se detêm para ler as mensagens das bandeirolas e alguns estabelecem diálogos com eles. ”Me parecem simpáticos, porque são combativos, mas não estou de acordo com eles. As finanças produzem riquezas para todos. As bandeirolas são divertidas, mas refletem um mundo imaginário”, diz um dos eminentes habitantes da City. Está vestido segundo a última moda: traje impecável, mas sem gravata. O sonho era ocupar o London Stock Echange, isto é, a bolsa.

Spyro Van Leemen, um dos representantes do movimento OLSX, Occupy London Stock Echange, assegura que ninguém os moverá dali: ”nós vamos ficar todo o tempo que faça falta para que o governo entenda e se decida a mudar a ordem das coisas”. O jovem tem, como os outros, uma convicção inquebrantável e um montão de causas que convergem em uma: a reparação das injustiças, começando pelas que provoca o impune sistema financeiro. As conversões entre os ocupantes traduzem suas preocupações, perfeitamente refletidas nas bandeirolas e grafittis: a democracia, a justiça, o excremencial sistema financeiro, a corrupção, as mãos manchadas dos políticos, o desemprego, o preço alucinante dos alugueis, o fim da ocupação dos territórios palestinos.

Não são nem marxistas, nem revolucionários, nem comunistas, nem anarquistas, nem de extrema esquerda. ”Somos do partido da solidariedade mundial”, diz Andrew, um rapaz de 25 anos que trabalha três dias por semana em um depósito de Londres e vem ao acampamento nos dias livres. Andrew é membro do outro movimento que organiza a ocupação da esplanada da catedral, Uncut, cuja meta é protestar contra a massa de recortes nos gastos públicos decretada pelo governo do Primeiro Ministro David Cameron. Spyro Van Leemen –27 anos- explica aos demais que o que estão vivendo são os “primeiros passos de uma grande mudança planetária que terminará por democratizar o sistema financeiro”.

Sean e John, outros dois jovens que vem dos subúrbios de Londres, contam que não se trata de desencadear uma revolução “e sim de forçar desde a sociedade para que se instaure uma regulamentação financeira constatável”. Sean comenta com ironia: ”os banqueiros e os traders se outorgam bônus e recompensas por milhões e milhões de dólares e deixam a nós a pior parte: políticas de austeridade, recessão, sacrifícios”. Em volta deles o vento agita as bandeirolas com as mensagens já universais: ”Salven a la gente, no a los bancos”. O sinos soam e os jovens dançam.

O Reverendo Giles Frases fez um pacto com os acampados para que se afastem das escadarias e à policia pediu que não rondassem os arredores da catedral anglicana. O cordão policial se formou um pouco mais longe, no Square Paternoster, por onde se ingressa à bolsa de Londres. O reverendo Frases simpatiza em silêncio com esta juventude que se instalou nas portas de seu reino de forma pacífica e fazendo sacrifícios. Mas com o passar dos dias as coisas se complicaram. As 70 barracas do início se tornaram agora mais de 150. A visita da Catedral é paga, mas a presença dos indignados afugenta os turistas e curiosos. O acampamento é uma atração maior que a própria catedral e as pessoas não entram. A Catedral emitiu um comunicado indicando que “talvez tenha chegado a hora de que as barracas se levantem”.

« Isso são as nossas democracias, pura aparência, falsa liberdade », diz com raiva Clem OU’Neil asssinalando o cordão policial que protege os tesouros financeiros da City. As noites são longas. O frio se gruda sem piedade. Dois rapazes de uma barraca vizinha tocam violão e cantam uma balada imperdível de John Martyn: “The early sun of London morning / Burned the darkness with unanswered Light”. As vozes são suaves, novas calorosas na manhã gelada. Os indignados londrinenses têm um inimigo mais poderoso que a polícia ou a bolsa: o frio. Por momentos o vento sopra com uma veemência já invernal. A jornada no acampamento transcorre com muitas atividades.

Oficinas de reflexão sobre a economia, a política ou o sistema financeiro, encontros com a imprensa e um montão de trabalhos práticos impostos pela vida em um acampamento urbano. Um dos maiores problemas que têm é a limpeza, depois vem a alimentação e melhorar o inexistente conforto. A questão da limpeza é essencial para evitar que as autoridades encontrem na sujeira um argumento para desalojar-los. O principio é inamovível: ”fazer do acampamento uma base permanente”, explica um dos porta-vozes dos indignados.

Estão bem organizados e se repartem nas tarefas segundo uma ordem já pactuada. Conseguir comida para tanta gente é uma façanha diária, mas os indignados não se vendem a qualquer um. Durante uma assembléia decidiram de quem iam aceitar ajuda e de quem não. Por unanimidade excluíram qualquer contribuição que venha do Mc Donalds. Ninguém parece estar em conflito. Os turistas aparecem, tiram fotos, outras pessoas vêm trazer cadeiras, cobertores, comida, alguns banqueiros, os autênticos, se detêm a falar com os rapazes. ”Me dá curiosidade, ver tanto sacrifício e saber, no fundo, que esses meninos não entendem como funciona o mundo e como são indispensáveis os bancos”, explica Peter, um analista financeiro da City que esparrama bom humor com o tom de sua voz. Claro –reconhece --há banqueiros desonestos e isso dos bônus em momentos como estes, não é uma boa idéia, é injusto, mas não por isso queimaremos um sistema que move o mundo e cria riquezas”, explica vai embora olhando seu relógio”.

Dan Gregory, um corretor de bolsa, é menos condescendente. ”Esta gente quer que volte o comunismo, estão loucos”, espeta bravo. É inexato. São democratas sem trabalho, excluídos, são os eleitos para alimentar o tributo da corrupção, a impunidade, a irresponsabilidade de um mundo que se destrói a si mesmo. O tempo parece ter-se detido. Isso não é Londres senão um lugar no Universo. Um lugar exposto e incompreendido. Tanta vontade, tanto empenho, tanta solidão. ”In a foreign city once again / You waved weekly in the night”, diz a canção de John Martín. ”Tenho fé assim mesmo”, reconhece Michael, um indignado de olhos que soam despertos. ”Fé de que pouco a pouco o mundo tome consciência e de que, todos juntos, sejamos capazes de pôr em movimento, em cada lugar deste planeta agonizante, uma força tão grande como a que os egípcios colocaram na Praça Tahrir”.

No fundo, esse é o sonho de todos: uma praça Tahrir Universal contra o capitalismo, pela democracia participativa, um retorno aos valores e à moral fundadores. Por isso resistem a tudo: à ironia, à indiferença, ao cinismo, à estupidez, à ignorância, à fome, ao frio outonal de Londres, a estas palavras. São poetas. E como todos os poetas não vivem envoltos em sonhos senão na nudez da realidade. Sob a pálida luz da manhã londrinense, nada têm de “indignados”. São, sim, seres que não se resignam a aceitar a voraz desproporção do mundo, que não caem em depressões metafísicas profundas porque não podem comprar o último modelo do iphone ou do ipad.

22/10/2011

Brasil venceu a calúnia?

Posted: 22 Oct 2011 12:43 AM PDT
(O abraço que Marco Aurélio Garcia deu em Orlando Silva
é um abraço que milhões de brasileiros queriam dar)


Foi uma sexta-feira turbulentíssima. A mídia apertou o cerco em torno de Orlando Silva. Seus exércitos iniciaram um bombardeio concentrado durante o dia inteiro, tentando produzir um fato consumado. Na verdade, desde o dia anterior, a mídia vinha divulgando que o Planalto "emitira sinais" de que Orlando deveria pedir demissão. A manchete do Jornal O Globo da quinta-feira era enorme, bombástica e definitiva: Planalto decide afastar Orlando Silva. E nesta sexta quase todos os principais jornalistas políticos anunciavam a queda do ministro como inevitável e certa.

Até que, finalmente, chega a patroa. Dilma Rousseff voltou da África, deu declarações irritadas acerca das notícias sobre sua suposta decisão de afastar Orlando Silva, reuniu-se a portas fechadas com o ministro e, por fim, decidiu que ele permanece no cargo. Foi uma tremenda vitória contra a calúnia, contra a manipulação da notícia, e contra os desmandos enlouquecidos de uma mídia sem escrúpulos.

A tensão gerada pela onda crescente e delirante de denúncias vazias acabou, como era de se esperar, transformando-se em rancor também contra o governo, acusado de agir com pusilanimidade em face ao golpismo midiático. "O governo é covarde", tem sido uma acusação frequente.

De fato, é inegável que os políticos brasileiros têm medo da mídia. É preciso entender, porém, que a mídia não precisa passar pelo incômodo eleitoral. Ela tem dinheiro e estabilidade. Já o poder dos representantes políticos sofre de uma grande "fragilidade" (que também é sua força) democrática: é temporário e descartável.

Lembremos que o conflito entre mídia e governo tem sido um problema grave em todo mundo, e acontece de uma forma muito acentuada na América Latina. As instituições políticas por aqui não são respeitadas. Mas é injustiça dizer que o governo brasileiro e as lideranças políticas não estão reagindo.

Hoje o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, fez declarações contundentes contra o que ele chamou de fascismo pós-moderno.


A própria presidente tem divulgado constantes declarações bastante enfáticas contra o prejulgamento e o linchamento político. Hoje mesmo o Planalto divulgou uma nota dura, seca e direta, como uma bala:

Nota à imprensa

Após a reunião com o ministro do Esporte, Orlando Silva, a presidenta Dilma Rousseff disse que o governo “não condena ninguém sem provas e parte do princípio civilizatório da presunção da inocência”.

“Não lutamos inutilmente para acabar com o arbítrio e não vamos aceitar que alguém seja condenado sumariamente”, disse a presidenta.

Na reunião, o ministro informou à presidenta que tomou todas as medidas para corrigir e punir malfeitos, ressarcir os cofres públicos e aperfeiçoar os mecanismos de controle do Ministério do Esporte.

Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República

Agora, é evidente que o governo precisa agir com prudência. O governo é um animal pesado, que se movimenta e se comunica com extrema lentidão e dificuldade, pois cada ato e cada palavra devem ser sopesados para que se coadunem sem traumas à sua mentalidade algo esquizofrênica, com múltiplas personalidades.

No entanto, a cada passo dado, a cada palavra emitida, dá-se uma grande transformação. Um pequeno gesto governamental pode ter um enorme significado histórico. O sofrimento do ministro Orlando Silva e dos militantes do aguerrido PCdoB, certamente se converterá numa consciência política mais aguçada, mais astuta, mais forte.

A estratégia de criminalizar a política tem sido o padrão da mídia. O simples fato de uma pessoa ser "filiada" a um partido político torna-a suspeita, como se esta filiação não fosse, na verdade, um ato de transparência ideológica. E o ministério dos Esportes pagou até por seus acertos. Condenou-se sumariamente o ministério pelo fato dele estar fazendo cobranças judiciais contra ongs dirigidas por filiados do próprio PCdoB, como era o caso das entidades dirigidas pelo PM João Dias.O ministério provou que não perdoa ninguém.

Faltou, como sempre, bom senso. O Ministério dos Esportes foi entregue ao PCdoB para que este implantasse políticas em linha com os ideais do partido. É natural, se ele deve contratar entidades privadas, que sejam selecionadas algumas que partilhem dessas mesmas estratégias. Há irregularidades? Sim, sempre há. Mas novamente usemos o bom senso. Há dois tipos de irregularidades. Algumas são provocadas por confusão burocrática. Muitas correspondem a desvios de verbas. Não há nenhuma relação destas últimas, porém, com o PCdoB. Ao contrário, no ranking da corrupção, o PCdoB sempre figurou num dos últimos lugares.

O Ministério mostrou que tem estado atento às irregularidades, às quais correspondem a um percentual pequeno do montante total das ações. Não se pode culpar o ministério, ou o ministro, por erros de terceiros. O ministério é obrigado a dar um voto de confiança às entidades com as quais tem parceria. O governo não pode antever que empresas lhe passarão a perna. O que ele faz é examinar as contas, no âmbito dos próprios ministérios, junto ao Tribunal de Contas e através da Controladoria Geral da União, e, no caso de encontrar problemas, tomar as devidas providências.

O que causa espanto nesse processo todo é a estratégia articulada da mídia para derrubar o ministro. Divulgam-se denúncias uma após a outra, sem preocupação nenhuma com sua consistência. O importante é fazer volume e criar uma atmosfera de crise e linchamento, com vistas a pressionar o governo a tomar uma decisão rápida e intempestiva.

A compra de um terreno de 370 mil num lugar isolado do interior de São Paulo é considerado um crime. O fato da mulher do ministro dos Esportes dar assistência na produção de um documentário feito por uma ONG, sob encomenda do ministério da Justiça, é sensacionalizado. "Mulher de ministro recebe dinheiro do governo", diz a manchete. Ora, a mulher do Serra tem ONG que recebe há anos patrocínio do governo de São Paulo. Dona Ruth, que Deus a tenha, sempre teve ONG patrocinada com dinheiro público. E os últimos casos envolvem milhões de reais, e uma relação direta entre as esposas e o governo, enquanto a mulher do ministro ganhou apenas 40 mil para trabalhar num documentário sobre a ditadura, que obteve, através de uma outra ong, patrocínio de um ministério sem nenhuma relação com seu marido.

Não é o caso de justificar um erro com outro, mas apenas apontar uma injustiça. A mulher do ministro não estava cometendo nenhuma ilegalidade. A lei do nepotismo proíbe o ministro de empregar a sua mulher no ministério, mas não fecha à ela, arbitrariamente, as portas de toda instituição pública.

Em Vigiar e Punir, Foucault nos fala que a história da punição evoluiu de tal maneira que os castigos corporais foram substituídos, gradualmente, por castigos voltados ao espírito:

... e desde então os juízes, pouco a pouco, mas por um processo que remonta bem longe no tempo, começaram a julgar coisa diferente além dos crimes: a alma dos criminosos.

É assim que tem feito a imprensa, ao assumir o papel de um verdadeiro e terrível tribunal de exceção.

Num mundo cada vez mais dominado pela comunicação rápida, onde uma acusação rapidamente multiplica-se em milhões de links, comentários, piadas e juízos, uma calúnia corresponde a um sofrimento bem pior do que uma dor física, porque ataca diretamente a honra, ou seja, a alma do acusado. E dificilmente a ferida cicatriza, porque é extremamente complicado fazer a calúnia fazer o caminho de volta, apagando seus rastros. Na era da internet, as acusações precipitadas, os comentários maldosos, as piadas cruéis, permanecem na rede para sempre, constituindo uma espécie de castigo perpétuo.

Não é de se espantar que os políticos tenham receio da mídia! A mídia pode destruir não apenas a sua carreira política, mas algo muito mais importante: a sua honra, a sua dignidade, a sua alma.

Diante de um poder tão terrível concentrado em mãos inescrupulosas, é natural, ou antes, é necessário que uma parte da sociedade exija que haja um controle democrático da mídia. Não podemos mais ficar reféns dessa nova espécie de tirania, que de certa forma, parece a mais terrível de todas, porque tem o poder de vida e morte sobre a honra dos cidadãos.

Como diria Lênin: o que fazer? Eu vejo as pessoas pedirem uma Ley dos Medios, ou democratização dos meios de comunicação, sem no entanto saber muito bem do que estão falando. E o debate, é forçoso dizer, está sendo vencido pela mídia corporativa. Quanto a isso, tenho mantido uma postura bastante cética. Eu acho fundamental que seja discutido um novo marco regulatório das comunicações. Mas tanta coisa vai mudar quando houver a convergência digital e a entrada definitiva das telefônicas no mercado de televisão digital e a cabo; tanta coisa vai mudar quando a maioria da população tiver acesso a uma banda larga decente; enfim, estamos no limiar de mudanças tecnológicas - e consequentemente, culturais - tão profundas, que acho um pouco ingênuo a gente pretender que será uma lei federal que mudará substancialmente, no curto prazo, a correlação de forças dentro da mídia.

O problema principal, a meu ver, é de ordem prática e orgânica para os partidos e forças políticas do campo popular. Eles têm sido o alvo principal dos ataques midiáticos. Não devemos, no entanto, alimentar um complexo de derrota fora da realidade. A esquerda, com mídia golpista e tudo, tem crescido a um ritmo bastante acelerado no Brasil, e possivelmente crescerá ainda mais em 2012.

Enfim, este problema de ordem prática pode ser resolvido com a instalação, dentro dos partidos e governos, de assessorias de comunicação mais competentes e mais ousadas. A sociedade civil engajada, ou seja, a militância, tem se mostrado bastante presente, e é justamente a ausência do governo nesta seara que a obrigou a portar-se com admirável autonomia e desenvoltura. Há uma responsabilidade, no campo da guerra da comunicação, que pertence à esfera privada, e neste campo também a mídia tem encontrado alguns obstáculos sérios. Há uma pedra no caminho da mídia: ou melhor, muitas pedras: os blogs progressistas.

Nestes momentos de tensão, as pessoas costumam se deixar levar por raciocínios e julgamentos apressados. Não se deve fazer uma análise política com paixão ou rancor. O governo tem se manifestado, nos últimos anos, com uma assertividade cada vez maior em relação aos ataques midiáticos. As declarações de Tarso Genro, acusando a existência de um fascismo pós-moderno (referindo-se, é claro, à mídia) seriam impensáveis há alguns anos. A maneira como Orlando Silva se portou durante esta crise, com altivez e serenidade, respondendo com muita objetividade a todas as calúnias, também mostra que os representantes políticos estão amadurecendo sim.



É preciso elogiar, sobretudo, o espírito combativo, solidário e enérgico do PCdoB e seus militantes, que diferentemente do PT, que costuma ceder a divisões internas, agiu como um bloco uníssono em defesa da honra de um grande quadro. Uma postura que certamente inspirou militantes e dirigentes de outros partidos.

Enfim, as instituições políticas brasileiras sofreram o enésimo ataque, e mais uma vez resistiram. Quero acreditar que, a cada ataque do conservadorismo midiático e golpista, as forças populares emergem fortalecidas. Afinal, não existe melhor exercício político do que a luta.

Devemos, portanto, combater essa tendência, tão constante em nosso povo que se tornou quase um vício, de nos autodepreciarmos. O Brasil venceu mais essa guerra. Orlando Silva resistiu. Devemos comemorar e usar esta experiência para as muitas batalhas que ainda virão. Provavelmente enfrentaremos derrotas, mas também aprenderemos com estas para vencermos mais à frente.

A necessária acomodação entre forças sociais antagônicas tem sido um terrível desafio para qualquer nação. Os EUA perderam quase 1 milhão de vidas com uma guerra civil onde o que estava em jogo era exatamente o mesmo que experimentamos no Brasil: a luta entre conservadorismo e progressismo. Mais tarde, viveu uma época de caça-às-bruxas que até hoje envergonha o povo americano. A Europa, por sua vez, antes de atingir seu atual estágio de desenvolvimento econômico, político e social, testemunhou o nascimento de ideologias fascistas que resultaram em massacres e guerras.

Não esperemos que seja fácil para o Brasil superar suas contradições. A mídia é a cabeça de uma poderosa hidra, e não tem poder por si só, mas por representar setores sociais situados no alto da pirâmide. Não a subestimemos. A mídia brasileira é talentosa, criativa, sabe se reinventar a cada derrota, e sabe que o Brasil, mal ou bem, precisa dela, já que ela é o meio pelo qual a maioria do povo tem acesso a informações necessárias à cidadania. Essa é uma guerra que lutaremos sem cairmos na tolice do maniqueísmo. Santo Agostinho ensinava que tudo que existe tem bondade, pois em caso contrário não existiria, nem poderia ser corrompido - pois o que é mal, por ser mal, não pode sequer ser corrompido. Tudo que existe vem de Deus, dizia ele; na minha versão atéia, isto significa que tudo que existe e tem força possui uma importância histórica e uma utilidade social (com exceção da escravidão, que é a negação da liberdade e, logo, da vida). Não adianta, portanto, pintarmos os atuais conflitos políticos como uma guerra do bem contra o mal. É ingênuo querer o fim da mídia corporativa ou achar que os políticos não deveriam dar mais entrevistas, nem comparecer a nenhum evento, etc. A única solução é um acordo. Um pacto de fortes. Não exatamente entre governo e mídia, mas entre governo, Justiça, sociedade civil e mídia. Precisamos de uma mídia independente dos governos. Mas não uma mídia caluniadora. As forças da História, de qualquer forma, estão em movimento, e em luta; diante da História, nobres são os que tombam de arma nas mãos. E numa democracia, a arma mais legítima - ou a única legítima - é a inteligência. Como dizia Morrison: the old get older, the young get stronger; they got the guns, but we got the number. Come on, baby, and take it over!

19/10/2011

Partido pra quê?

Por Mouzar Benedito.

Com a greve dos correios, lembrei-me dos tempos de fundação do PT, quando um núcleo do partido funcionava na minha casa.
O carteiro da região me entregava a correspondência do partido todo animado e se revelou um petista dos mais militantes. Não tinha muito tempo para conversar com a gente no horário de trabalho, mas sempre pedia e dava notícias e inspirava muito otimismo. Eu o encontrava nas manifestações que ocorriam aos domingos e, aí sim, conversávamos.
Estávamos numa ditadura agonizante e o carteiro achava que com democracia tudo haveria de melhorar. Com o PT defendendo os trabalhadores, melhor ainda. Seria o fim dos tempos em que as correções salariais, por exemplo, eram baixadas por decreto, sem chance de negociação.
Até eu me mudar de casa, ainda antes do fim da ditadura, ainda o encontrei em manifestações, mas depois as manifestações foram raleando e não o vi mais, mas imaginava sua alegria vendo o PT crescer, ganhar prefeituras importantes e governos de estados, já em plena “democracia”.
Mas sei que seu emprego não melhorou nos sucessivos governos federais. Quando Lula chegou à presidência, acho que ele já devia estar aposentado, ganhando pouco, o que não mudou muito com Lula, por sinal.
Uma das coisas que todos nós imaginávamos é que com o PT no poder acabaria o tempo em que o Estado se negaria a negociar com os trabalhadores. O patrão (o governo, no caso) fazia uma proposta escrota e não arredava o pé, tendo como consequência uma greve. Aí o patrão-governo dizia que não negociava com trabalhadores em greve e por fim a Justiça resolvia a coisa a favor do patrão, ameaçando o sindicato com multas e outras coisas.
Mas aos governos, sejam de que partido forem, parece que o que interessa é agradar o deus mercado, mostrar para ele que não foge de suas regras. Se o banqueiro, o executivo de multinacionais e os empresários nacionais “negociam” de um jeito, por que o governo faria de outro? A gente poderia responder: “Porque tal partido foi criado para ser diferente”. Mas a coisa mudou.
Acredito que o carteiro petista de primeira hora daquele início dos anos 1980, se estiver vivo, está aposentado e escapou de ver como o PT como patrão negociou com os funcionários dos Correios, que finalmente, obrigados pela Justiça, voltaram para o trabalho com o rabo entre as pernas.
Se estiver vivo, o carteiro pode se lembrar de uma velha máxima do reinado de Pedro II, quando o Partido Conservador, liderado por grandes pecuaristas, usineiros e fazendeiros em geral representava o status quo, o poder centralizado, e tinha como oposição o Partido Liberal, mais urbano, cheio de bacharéis e comerciantes, defensor da federalização da monarquia, progressista. Pois quando chegou ao poder, o Partido Liberal se revelou muito semelhante ao Conservador. Daí a máxima da época: “Nada é mais parecido com um conservador do que um liberal no poder”.
Assim tem sido no Brasil.
Mas que não se assanhem os conservadores dos tempos atuais, dizendo que com eles a coisa é melhor. Aliás, a tal máxima tem uma segunda parte: “… e nada mais parecido com um liberal do que um conservador na oposição”.
Tucanos e afins podem fazer boas propostas como oposição, mas no poder… Basta lembrar dos oito anos de governo FHC para ver como eles tratam os trabalhadores. Foi de FHC a iniciativa de “quebrar a espinha” do sindicalismo, a partir do não cumprimento pelo governo de um acordo feito com os petroleiros, logo no início do governo dele. Com a cumplicidade da imprensa, os trabalhadores foram demonizados, culpados por todos os males do Brasil, embora tenha sido o governo que não cumpriu o acordo.
E basta ver também o que acontece em Minas até hoje. Lá, em oito anos de governo, Aécio Neves, com seu “choque de gestão”, tendo a imprensa como aliada, ficou famoso como um grande administrador, mas sua grande obra foi governar oito anos sem dar aumentos, sufocando os trabalhadores. E seu sucessor continua na mesma linha.
A profissão de professor chegou a ser boa em Minas, pelo menos melhor do que em São Paulo, outro reino tucano. Sob o tucanato virou subemprego. E viva Aécio Neves! E viva Anastasia!
Ah, tem os governos do PMDB… Vejam no Rio, por exemplo, o que faz Sérgio Cabral (o filho – sempre procuro livrar a cara do pai) com o professorado e com os bombeiros. Grevista, pra ele, é bandido.
Não vejo entre os partidos algum que tenha postura diferente, a não ser os que nunca chegaram ao governo. Alguns pequenos podem até ser coerentes hoje, mas no sistema existente, se quiserem chegar ao poder e se manter nele, têm que entrar na onda, virar uma feira da barganha.
É um sistema corrupto e pró-capital, por natureza, e os partidos se submetem a ele. Ética e política não combinam, já se diz há muito. E nesse sistema, menos ainda. Sem uma base forte, que se compra com cargos e vistas grossas, não se governa. Não precisamos de reforma partidária. Precisamos mudar o sistema todo, para um que seja democrático de verdade, sem esse penduricalho inútil chamado partido.

De Flip, Flupp, Daslu, Daspu e outros babados

Campanha Daspu - Da farofa ao caviar

Por Emir Sader

Confesso que nunca gostei da Flip. Sempre me pareceu sumamente elitista. Grandes editoras globalizadas promovem seus autores estrangeiros, salpicados por alguns brasileiros, numa badalação daquelas, entre agentes internacionais e internacionalizados, jornalistas babando e preços exorbitantes, em um cenário belíssimo, mas proibitivo para a grande maioria.
Me lembro que há uns anos realizou-se uma Feira de Livros para a Juventude na Baixada Fluminense, em um mês de agosto, quando ainda não baixava a espuma da badalação da Flip – a que se dedica a velha mídia de abril a agosto. Foi difícil encontrar lugar, mas principalmente se contou com algumas editoras alternativas apenas, a maioria mandou saldos e a mídia não deu praticamente nenhuma cobertura.
Só posso olhar com simpatia a I Feira Literaria Internacional das UPPs – Flupp –, que será realizada no Morro dos Prazeres, em novembro de 2012. Algo que nunca poderia se realizar não fosse a política de ocupar os espaços liberados ao controle cruel das gangues do narcotráfico, para promover políticas sociais e culturais.
A Flupp está para a Flip assim como a Daspu está para a Daslu. Como as iniciativas das elites para iniciativas que buscam realizar-se nos espaços populares, até recentemente controlados pelo narcotráfico. Ainda é cedo para saber do sucesso da política das UPPs, assim como da Flupp, mas vale a pena apostar e contribuir. É a aposta mais importante no Rio e, se der certo, pode servir para tantas outras grandes metrópoles brasileiras.
Já que falamos em elites e alterantivas populares, é significativo que um bom poeta, de trajetória esquerdista – já foi comunista – era praticamente desconhecido. De repente, quando passou para a direita, ganhou coluna semanal em jornal, elogios por todos os lados e prêmios. Não há prêmio que não lhe deem. Apesar de sua reconhecida feiura, só falta ganhar prêmio de Mister de beleza, de algum cosmético de moda. Assim a elite recompensa quem aceita comer na sua mão, quem passa a preferir a Daslu à Daspu, a Flip à Flupp.

15/10/2011

15 DE OUTUBRO NÃO É DIA DO PROFESSOR!!!!!!!!!

15 DE OUTUBRO NÃO É DIA DO PROFESSOR!!!!!!!!!
 

E sim o dia do profissional mais importante do mundo, aquele que faz a humanidade perdurar e o mundo funcionar como deve, imagine o mundo sem eles e imaginarás uma sociedade em colapso. 

Professor é aquele que forma um profissional. 
Um edifício não está de pé por conta de um bom engenheiro, e sim porque quem o fez um bom engenheiro, o professor. 

São eles que formam os profissionais e também, muita das vezes, ajudam na formação do seu caráter, lá no passado, lembra? Quando a tia Teteca disse que bater no amiguinho era feio? 

Parabéns àqueles que são a base de tudo que se pode imaginar, ninguém é capaz de ser algo sem eles. 

Parabéns!!! Vocês merecem muito mais que só um dia, que nem feriado é.

SERIA UTOPIA (Arnaldo Jabor)

“Fui criado com princípios morais comuns:
Quando eu era pequeno, mães, pais, professores, avós, tios, vizinhos, eram autoridades dignas de respeito e consideração. 
Quanto mais próximos ou mais velhos, mais afeto. 
Inimaginável responder de forma mal educada aos mais velhos, professores ou autoridades… Confiávamos nos adultos porque todos eram pais, mães ou familiares das crianças da nossa rua, do bairro, ou da cidade… 
Tínhamos medo apenas do escuro, dos sapos, dos filmes de terror… 
Hoje me deu uma tristeza infinita por tudo aquilo que perdemos. 
Por tudo o que meus netos um dia enfrentarão.
Pelo medo no olhar das crianças, dos jovens, dos velhos e dos adultos. 
Direitos humanos para criminosos, deveres ilimitados para cidadãos honestos. 
Não levar vantagem em tudo significa ser idiota. 
Pagar dívidas em dia é ser tonto… 
Anistia para corruptos e sonegadores… 
O que aconteceu conosco? 
Professores maltratados nas salas de aula, comerciantes ameaçados por traficantes, grades em nossas janelas e portas. 
Que valores são esses? 
Automóveis que valem mais que abraços, filhas querendo uma cirurgia como presente por passar de ano. 
Celulares nas mochilas de crianças. 
O que vais querer em troca de um abraço? 
A diversão vale mais que um diploma. 
Uma tela gigante vale mais que uma boa conversa. 
Mais vale uma maquiagem que um sorvete. 
Mais vale parecer do que ser… 
Quando foi que tudo desapareceu ou se tornou ridículo?
Quero arrancar as grades da minha janela para poder tocar as flores! 
Quero me sentar na varanda e dormir com a porta aberta nas noites de verão! 
Quero a honestidade como motivo de orgulho. 
Quero a vergonha na cara e a solidariedade. 
Quero a retidão de caráter, a cara limpa e o olhar olho-no-olho. 
Quero a esperança, a alegria, a confiança! 
Quero calar a boca de quem diz: “temos que estar ao nível de…”, ao falar de uma pessoa. 
Abaixo o “TER”, viva o “SER”. 
E viva o retorno da verdadeira vida, simples como a chuva, limpa como um céu de primavera, leve como a brisa da manhã!
E definitivamente bela, como cada amanhecer. 
Quero ter de volta o meu mundo simples e comum. 
Onde existam amor, solidariedade e fraternidade como bases. 
Vamos voltar a ser “gente”. 
Construir um mundo melhor, mais justo, mais humano, onde as pessoas respeitem as pessoas. 
Utopia? Quem sabe?… Precisamos tentar… 
Quem sabe comecemos a caminhar transmitindo essa mensagem… 
Nossos filhos merecem e nossos netos certamente nos agradecerão!”.

SOU MULHER ( Patricia Moraes)

Não venha falar de amor se você não sabe lidar com isso. 
Não ofereça compromisso se não é isso que você quer. 
Não me envolva, para depois querer me deixar de canto. 
Não sou um brinquedinho que você pode brincar até enjoar. 
Pareço menina,choro como uma menina,ajo muitas vezes com imaturidade de uma menininha assustada,mas sou mulher. 
Não esqueça disso:sou mulher. 
Toda mulher é muito menina,tem medos,chora, age sem pensar. 
Mulher é sentimento. 
Sou sentimento,sentimento profundo,me entrego inteira,se não consegue ficar nem com a metade disso,por favor,fique sem nada. 
Você pode achar que não,mas sou mulher. 
E preciso de um homem para lidar com isso,um menino para meu lado de menina,mas um homem que agüente meu lado de mulher. 
Isso é raro,sabe? Achar um homem,quero dizer. 
Algum que não se assuste,que queria dividir, que saiba somar. 
Não quero ninguém para me empurrar, tão pouco quero guiar alguém: não, não confunda, quero alguém para andar junto comigo.
Te disse,sou mulher. 
Sabe todas aquelas vezes que eu pedi não me deixa,não sei viver sem você? Mentira bobinho. 
A gente sempre consegue. 
Querido,sou capaz de ficar horas e cima de um salto quinze e continuar sorrindo no fim do dia,eu enfrento depilação com cera quente,eu faço a sobrancelha com pinça,faço dietas sem comer carboidrato,me diz,você acha mesmo que eu não consigo viver sem você? 
Cai na real,garoto.Vê se cresce. 
Você sabe que vai sentir falta não é? E que vai me procurar em tantas outras garotinhas por aí. 
É assim que vocês são. 
E no fundo,colocam a culpa na gente. 
Olha,ser homem é muito fácil,é tudo natural. 
Traição é natural. 
Medo de compromisso é natural. 
Imaturidade é natural. 
Mas no fim,lá no fundinho da cabeça de vocês, vocês sofrem e se escondem atrás de todas essas desculpas.
Mas querido, sou mulher. 
Sou capaz de sofrer amargamente, de chorar rios de lágrimas quando chegar em casa,mas sou capaz de continuar. 
Com você,ou sem você. 
Não demora,logo passa. E se não passar? Eu passo adiante.

Patrões sonegam R$ 20 bi em hora extra a trabalhador, diz Anamatra

Carta Maior

Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho diz que brasileiro cumpre jornada superior a 44 horas semanais e não recebe o devido. Segundo auditor-fiscal, sobrecarga mata três ao mês. Sindicalistas exigem que Congresso reduza jornada e que governo imponha ponto eletrônico às firmas. Ministério do Trabalho deu prazo para ponto ser adotado a partir de janeiro.

BRASÍLIA – Os trabalhadores brasileiros deixam de receber por ano R$ 20 bilhões em hora extra sonegada pelos empregadores. O principal motivo, segundo a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), seria a manipulação dos registros da jornada pelas empresas. “O brasileiro trabalha muito mais do que 44 horas semanais e nem recebe por isso”, disse o desembargador Luiz Alberto de Vargas, diretor da entidade.

A implementação de ponto eletrônico nas empresas, para registrar a hora de entrada e saída dos funcionários, ajudaria a coibir a sonegação. Centrais sindicais e ministério do Trabalho tentam há tempos impor essa obrigação às empresas, por meio de uma portaria do próprio ministério. Mas entidades patronais têm resistido, e o governo acaba recuando. A previsão hoje é que entre em vigor em janeiro.

“O ponto é solução para a questão das horas extras dos trabalhadores, por garantir proteção ao trabalhador e segurança jurídica às empresas”, diz a secretária de Inspeção do Trabalho do ministério, Vera Albuquerque.

O não pagamento de hora extra subtrai dinheiro não apenas dos trabalhadores, mas do cofres públicos também, já que uma parte da remuneração vai para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). “Esse dinheiro poderia estar financiando a construção de casas populares”, diz o auditor fiscal do Trabalho Vandrei Barreto de Cerqueira.

Ele acrescenta um dado ainda maio dramático decorrente de uma jornada de trabalho longa, além da não remuneração. Três brasileiros morrem em média por mês, graças a sobrecarga. “Nos últimos cinco anos, tivemos 430 acidentes de trabalho causados por sobrejornada, dos quais 167 foram fatais”, afirmou.

As centrais sindicais têm pressionado o Congresso a votar a redução da jornada de trabalho de 44 horas semanais para 40 horas. Dominado por empressários - 45% dos parlamentares são empresários, segundo pesquisa do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) -, o Congresso tem ignorado apelo.

A adoção do ponto eletrônico assunto foi discutida nesta segunda-feira (10) em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos do Senado. Representante da Confederação Nacional da Industria (CNI) no debate, Paulo Rolim disse que o setor não está preparado para arcar com os custos do ponto eletrônico (cerca de R$1,2 mil por unidade).

13/10/2011

O RESGATE DE UM NÁUFRAGO (Felipe Lustosa)


Sou o náufrago de uma época: aquela em que eu não existia!
De costumes que não fazem parte do meu livre-arbítrio enjaulado,
De concepções que caíram por terra abaixo com um eco triunfante, vindo do norte..
De princípios que foram corroídos e deformados pela ética dos anos 90.
  
Sou um náufrago dos sopros vermelhos, oriundos dum outro continente,
Dum outro século, duma outra sociedade,
Duma sociedade mais social do que a nossa...
Duma outra primavera: “aquela das idéias que revolvem”.
Idéias que inclusive, deitaram abaixo uma Duma díspar...

Sou o sobrevivente dum outro agora, um agora que não existiu em meus agoras:
Um agora, que se faz mais necessário (no atual agora), do que nunca.
  
Sou um náufrago duma outra sociedade,
Náufrago dum outro clima: não do discurso do “clima dos trópicos”,
Mas do discurso do clima da insurgência.
Duma outra cultura, com outros valores,
Que não podem ser comercializados, num livre mercado.
 
Sou um náufrago sem ter sido tripulante,
Dum barco que não naufragou, e que siquer pisei..

Sou um náufrago dum determinado tempo histórico,
Sem de fato, ter pertencido a ele..

Sou o órfão dum outro tempo:
Um órfão meio que abiogênico,
Um órfão da poeira estelar,
Um órfão que não teve uma parideira.
Um órfão que abrolhou do nada, espontaneamente.

Sou a essência dum outro ser humano,
Que existiu e pensou muito antes de mim.
Essencial nos dias de hoje:
E que não se vê muitos, por aí...

Sou um náufrago da utopia.
Que já existia antes de minha existência.
Não pertenci a ela e não a vivi.
Não participei dela e não fui um voluntário.
Não fiz parte dela e não lutei por ela,

Mas ela esta em mim,
Está em mim, como os pelos estão em meu rosto.
Ela é eterna, e eu não.

Quando o sol me agracia com seus raios matutinos..
Contemplo-o como um camarada,
Camarada fiel às nossas convicções!
Com um caco de espelho, sinalizo ao horizonte.
Como se usasse o telégrafo, durante uma invasão;
Em um flanco esquecido, com uma bala nas entranhas..
“A utopia está distante, mas ela é o meu único resgate.”