Sob o meu olhar

Aqui neste blog, vocês poderão ver, ler e comentar a respeito do que escreverei. Por meio deste meu olhar sincero, tentarei colocar artigos e dar minha opinião sobre questões atuais como politica, problemas sociais, educação, meio ambiente, temas que tem agitado o mundo como um todo. Também escreverei poesias e colocarei poemas de grande poetas que me afloram a sensibilidade, colocarei citações e frases pequenas para momentos de reflexão.
É desta forma que vou expor a vocês o meu olhar voltado para o mundo.

26/09/2012

A busca da verdade é uma ação de transformação do presente


Por Edson Teles - Blog da Boitempo.
O consenso, elemento essencial da transição brasileira, negou caráter público à memória dos atos violentos do Estado – publicidade que se viu reduzida à memória privada, à memória de indivíduos ou de grupos identitários, não incluídos entre os protagonistas do pacto. Sobretudo, o consenso oficial limitou o repertório social sobre a memória, necessário para a realização do processo de compreensão do passado. O trato institucional da memória, de modo geral, tem sido capaz de evocá-la como tema ou, no máximo, processá-la como informação, mas não de praticá-la em seus aspectos transformadores e criadores. Se, por um lado, a ausência, a perda, a nostalgia, a melancolia, o desaparecimento evocam a dimensão mais brutal da violência, por outro, possuem a conotação de morbidez simbólica do momento de mobilização social e histórica, criando um silêncio sobre a relação entre o passado originário e o presente, uma lacuna na memória sobre os anos de catástrofe social e política.
Cabe-nos perguntar: qual o papel desempenhado pelo passado no tempo presente e, em especial, o papel da memória dos anos autoritários na ação política atual? É possível esquecer os horrores e nos voltarmos para um futuro sem violência? Ou o inesquecível da tortura continua a habitar as cenas públicas e privadas da democracia?
A transição começou a ser pensada e formulada pelos militares, desde o começo do governo Geisel (1974-1978), procurando construir uma abertura lenta, gradual e segura, na qual o estatuto político da nova democracia pudesse ser acordado de antemão e, principalmente, se mantivesse o controle militar do processo. Ainda em 1977, o governo impõe o Pacote de Abril, fechando o Congresso Nacional por 15 dias (entre 1º e 15 de abril) e outorgando uma série de medidas limitando as possibilidades de ruptura na abertura: eleição indireta para governadores incorporada à Constituição; seis anos de mandato presidencial; senadores biônicos, eleitos indiretamente; entre outras. O governo mantém as medidas de abertura gradual nas ações de outubro de 1978, quando extingue a capacidade do presidente de fechar o Congresso Nacional e de cassar direitos políticos, devolve o habeas corpus, suspende a censura prévia e abole a pena de morte. Logo em seguida, no mês de dezembro, é tornado extinto o AI-5. A abertura militar fundamentava-se na lógica do consenso e a anistia ainda não era considerada como parte das ações possíveis no processo lento e gradual. Quando nos anos de 1977-78 foram montados os primeiros pacotes de reformas da abertura, falava-se no máximo em revisões de algumas penas, como a dos banidos.
A violência originária de determinado contexto político, que no caso da democracia seriam os traumas vividos na ditadura, mantém-se seja nos atos ignóbeis de tortura ainda praticados nas delegacias, seja na suspensão dos atos de justiça contida no simbolismo da anistia, lei aceita pelas instituições como recíproca – agindo em favor das vítimas e da resistência armada, bem como dos torturadores. Tais atos, por terem sido silenciados nos debates da transição política, delimitam um lugar inaugural de determinada política e criam valores herdados na cultura, tanto objetivamente, quanto subjetivamente – nas narrativas, nos testemunhos, nos sentimentos e paixões do sujeito, subtraídos da razão política.
Nos aspectos sociais e nacionais, as marcas de esferas políticas originárias, como a sala de tortura e a transição consensual, se constituem como partes fundantes da democracia nascida após o fim da ditadura. O caráter maldito da tortura e o aspecto de impunidade da democracia incluem na atual memória coletiva brasileira o medo da violência e da fabricação do corpo nu dos torturados e desaparecidos, pela ausência do acesso às leis. A aceitação simbólica da anistia aos torturadores como uma lei de anulação das possibilidades de justiça, se configurou, seguindo à sala de tortura, como a exceção política originária na qual a vida exposta ao terrorismo de Estado vem a ser incluída no ordenamento social e político.
Fatos da democracia, como a impunidade gerada na lei de anistia, a insuficiência das posteriores leis de reparação ou indenização em fazer justiça, a não abertura dos arquivos militares surgem como paradigmas silenciosos do espaço político e da memória, dos quais nos é profícuo aprender a reconhecer os limites e alcances.
Controlar a memória ou anular suas tensões é um ato da política. Memória é política e a memória dos anos de violência é, no presente, uma questão política. O maior paradoxo da democracia encontra-se na convivência da recordação, um movimento em direção ao passado, com o compromisso de criação de uma nova história no presente, um olhar para o futuro.
Quando, no presente, a busca pela verdade sobre o passado é evocada, procura-se uma transformação do presente. A busca pela verdade do passado é antes uma ação de rejeição à mentira e à omissão, um valor ético de elaboração da memória, mas também uma ação política. Com a Comissão da Verdade e a luta por justiça, condições foram criadas para pensarmos em uma convivência democrática na qual a publicidade dos traumas e ressentimentos, por meio das narrativas dos eventos passados, promova a política como dissenso e livre partilha das memórias.

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