O ministro Joaquim Barbosa pode até espernear, tentar agredir verbalmente, levantar a voz, desqualificar, fazer jogo de cena, posar e falar para os holofotes midiáticos, como normalmente acontece quando é contestado em suas pretensas verdades absolutas. Mas é implacável e arrebatadora a entrevista de Claus Roxin, publicada neste domingo pela Folha de S. Paulo.
Roxin, 81 anos, jurista alemão que ajudou a especificar e aperfeiçoar a teoria do domínio do fato, coloca os argumentos usados pelo relator do processo do mensalão na berlinda, confirmando um fundamento elementar do Estado Democrático de Direito: não é possível condenar sem provas. E todos são inocentes até que se prove o contrário.
Perguntam Cristina Grillo e Denise Menchen, repórteres do jornal: "É possível usar a teoria (do domínio do fato) para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?".
O jurista alemão responde, de forma cristalina e precisa: "Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso (da doutrina)”.
A Folha replica: "O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em corresponsabilidade".
Roxin é novamente bastante objetivo: "A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ("dever de saber") é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso de Fujimori (ex-presidente do Peru), por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados".
Por fim, as repórteres questionam: "A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?".
Roxin finaliza: "Na Alemanha, temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública".
Trocando em miúdos: o jurista que é referência internacional no assunto justamente por ter sido o responsável por consolidar a teoria está a sugerir que o Supremo Tribunal Federal não poderia ter usado o "domínio do fato" para garantir as condenações já estabelecidas, no caso do mensalão.
A partir desse raciocínio, é possível reforçar a impressão de que a tese foi utilizada de forma enviesada, sem os devidos fundamentos jurídicos, com intuito de prestar contas para a opinião publicada, estabelecendo ainda condenações políticas, sem provas.
E a quem os condenados agora podem recorrer?
POR CHICO BICUDO - Correio da Cidadania
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