Por Redação, com RBA - de Brasília
O ano vai acabar primeiro que o julgamento do processo conhecido como ‘mensalão’.
Mesmo encerrada no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), a Ação
Penal (AP) 470 ainda será objeto de recursos e embargos por parte dos
advogados dos réus condenados no início de 2013 e merecerá nova análise
do colegiado, que voltará a ser composto por 11 ministros. Após a
análise desses recursos, não estão descartadas mudanças no resultado
final do julgamento.
Mas o episódio do ‘mensalão’ não se encerrará por aí. Terá
diversos desdobramentos ao longo do ano, com o julgamento de 45
processos derivados do principal e o aguardado desenrolar do processo
sobre o ‘mensalão tucano’ em Minas Gerais, gênese do esquema montado
pelo empresário Marcos Valério e mais tarde repetido em nível federal.
Além disso, há grande expectativa quanto ao efeito que as decisões
tomadas pelo STF no julgamento do mensalão terá sobre as decisões dos
tribunais de primeira e segunda instâncias em todo o país.
Efetivado em 1998, durante a campanha de reeleição de Eduardo
Azeredo, hoje senador, ao governo de Minas, o ‘mensalão tucano’ teve as
mesmas características do ‘mensalão’ federal e foi montado, segundo a
acusação, a partir do desvio de recursos públicos e da tomada de
empréstimos forjados junto ao Banco Rural. Os casos são idênticos, mas o
tratamento dado a eles pela Procuradoria Geral da República, não. No
caso do ‘mensalão’ em Minas Gerais, o processo foi desmembrado, o que
faz com que nove dos 12 réus sejam julgados em primeira instância, o que
lhes dará tempo e possibilidades para vários recursos. Por terem
direito a foro privilegiado, somente serão julgados no STF o próprio
Azeredo e o vice em sua chapa na ocasião – e hoje também senador –
Clésio Andrade (PMDB).
Pelo andar dos fatos, é possível que o julgamento do ‘mensalão
tucano’ não ocorra em 2013. Todas as testemunhas indicadas pelo
Ministério Público Estadual já foram ouvidas, mas ainda falta ouvir
aquelas de defesa, entre elas o presidente nacional do PSDB, Sérgio
Guerra. Somente após a conclusão das oitivas será aberto prazo para que
acusação e defesa façam suas alegações finais.
Mesmo no STF, a tendência é que o ‘mensalão tucano’ demore a ser
julgado. Relator do processo, o ministro Joaquim Barbosa anunciou ainda
durante o julgamento da Ação Penal 470, da qual também é relator, que
iria deixar a função, pois, segundo ele, não terá tempo de exercê-la por
conta das obrigações como presidente do STF. A relatoria do processo do
mensalão tucano será assumida pelo ministro, ainda não indicado pela
presidenta Dilma Rousseff, que irá substituir o já aposentado Carlos
Ayres Britto.
O novo ministro provavelmente pedirá tempo para ler os autos e se
inteirar do processo, o que pode levar meses, e depois abrirá novos
prazos para eventuais diligências complementares e para as alegações
finais de acusação e defesa. A passagem do tempo é favorável a Azeredo.
Em dezembro de 2013 prescreverá o crime de peculato, caso o
ex-governador seja condenado à pena mínima de dois anos. Azeredo também
foi indiciado pelo crime de lavagem de dinheiro, assim como Clésio
Andrade.
Além de Marcos Valério, estão indiciados no processo que corre em
Minas: o ex-vice-governador, Walfrido dos Mares Guia; o ex-secretário de
Administração, Cláudio Mourão; o ex-secretário de Comunicação, Eduardo
Guedes; o ex-presidente do Bemge, José Afonso Bicalho; os ex-diretores
da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Comig, atual
Codemig), Lauro de Lima Filho e Renato Cordeiro; o ex-diretor da
Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), Fernando Soares e os
sócios de Valério na empresa SMP&B, Cristiano Paz e Ramon
Hollerbach.
Processos paralelos
O inquérito da Ação Penal 470 também rendeu processos paralelos que
crescerão ao longo de 2013. São 45 processos abertos no fulcro do
processo principal pela Justiça Federal no Distrito Federal e nos
estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.
Além dos 37 réus julgados pelo STF no processo do ‘mensalão’, outras 80
pessoas estão indiciadas em processos que, em alguns casos, sequer
passaram da fase de análise do mérito.
Em Brasília, serão julgados cinco processos por improbidade
administrativa – crime que não constou da Ação Penal 470 – onde aparecem
como réus José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha, Delúbio Soares,
Silvio Pereira e Marcos Valério, entre outros. No único processo por
improbidade mais adiantado, o procurador da República Frederico Paiva
imitou o gesto do procurador-geral, Roberto Gurgel e, fazendo citações
ao julgamento do ‘mensalão’, pediu a condenação de João Paulo Cunha.
Os desdobramentos do julgamento da Ação Penal 470 em termos jurídicos
também são esperados em 2013, pois as decisões tomadas pelo STF
invariavelmente tornam-se normas. seguidas pelos tribunais de instâncias
inferiores. A curiosidade aumenta porque para condenar os réus do
mensalão o Supremo adotou teses inéditas – algumas controversas – como a
teoria do “domínio do fato”, utilizada por Joaquim Barbosa para pedir a
condenação de José Dirceu, ou a ausência do “ato de ofício” para
caracterizar o crime de corrupção, critério utilizado em prejuízo de
diversos réus.
Até o início do julgamento do ‘mensalão’, as provas indiciárias eram
consideradas insuficientes para garantir a condenação de um réu,
critério utilizado inclusive pelo próprio STF. Isso foi subvertido no
voto de Barbosa e acatado pela maioria do plenário, gerando grande
expectativa quanto à sua repercussão e influência nas instâncias
inferiores, sobretudo na esfera criminal. Outra novidade trazida por
Barbosa e adotada no STF foi o fatiamento do julgamento, método jamais
utilizado no Supremo e que agora pode se tornar comum em todas as
esferas da Justiça brasileira.
O ano de 2013 ainda não começou, mas caberá a ele dizer se o
julgamento do ‘mensalão’ foi inovador e trouxe mudanças que vieram para
ficar, como querem os mais otimistas, ou se foi realmente um “julgamento
de exceção”, como dizem diversos advogados dos réus. Ex-ministro da
Justiça e advogado do réu José Roberto Salgado na Ação Penal 470, Márcio
Thomas Bastos, durante sua defesa oral no plenário do STF, qualificou o
julgamento como “um retrocesso na área penal” e fez um alerta sobre
suas conseqüências em termos de jurisprudência:
– A Suprema Corte está flexibilizando perigosamente algumas garantias – concluiu, acerca do julgamento do ‘mensalão’.
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