02/12/2012

“Marighella” retrata história do impetuoso “tio Carlos”

Fábio Nassif - Carta Maior

São Paulo - No ano em que uma das figuras mais importantes da esquerda brasileira, Carlos Marighella, recebeu sua anistia 'post mortem', a diretora de cinema Isa Grinspum Ferraz conseguiu o que almeja há anos: lançar um documentário sobre a vida do militante. “E por feliz coincidência a Comissão da Verdade saiu agora, pois o filme está dentro deste quadro importantíssimo. Finalmente se começa a mexer na ferida do Brasil”, completou Grispum, no encerramento da 7a Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul.

Com 100 minutos, Marighella aborda as “mil faces de um homem leal”, como gravou o músico Mano Bronw especialmente para o documentário. “O filme é uma investigação e eu fui descobrindo durante o processo de feitura do filme muitas facetas do Marighella. A história dele é uma saga verdadeira. Ele lutou durante quarenta anos initerruptamente”, contou Grinspum à Carta Maior. 

Segundo a diretora, o primeiro corte do filme ficou com quatro horas e meia de duração, o que mostrava de maneira mais completa sua vida, mas era impossível deixa-lo com tal duração para projeção no cinema. Ela sugere que outros filmes ficcionais ou documentários sobre Marighella sejam feitos.

O filme é ambientado com gravações musicais da época, imagens das cidades em que Marighella viveu e cenas de documentários. Como não há filmagens do militante, a história em si é contada através dos depoimentos de ex-companheiros de Partido Comunista Brasileiro (PCB) e Ação Libertadora Nacional (ALN), e principalmente por sua companheira Clara Charf.

Seja pela filiação de um pai imigrante italiano anarquista com uma mãe negra filha de escravos trazidos do Sudão, ou pelas formulações políticas que tentavam responder os desafios de uma revolução comunista no Brasil, o filme reforça Marighella como um homem trabalhador, de origem pobre, que dedicou a própria vida para a melhoria da vida de seu povo.

O baiano chamava a atenção não só pelo seu porte físico mas também pela imensa criatividade utilizada em versos poéticos, por exemplo. Em 1932, Marighella é preso pela primeira vez no Rio de Janeiro. Quatro anos depois é preso novamente e submetido a torturas. Fato que se repete em 1939, quando ficou preso por mais seis anos.

Entre sua eleição como deputado em 1946 – ilustrada através de cartazes de campanha – e sua morte em 1972 por agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), o filme segue Marighella nas indas e vindas na clandestinidade, nas discordâncias com o PCB e nas viagens que fez à Cuba e à China para conhecer outros processos de mobilização.

Grispum queria deixar “claro por que o Mariguella agia da maneira que agia, inclusive o porquê optou pela guerrilha num dado momento, pela lutar armada, já num período em que não só a ditadura aqui estava muito brava como no mundo inteiro havia um contexto de luta armada”.

“Não chegava a ser Guevara, mas no Brasil a gente tinha Marighella”, diz um dos depoentes no filme, reproduzindo a imagem que pessoas da esquerda tinham já na época.

A humanização daquele que tinha um lado mítico para uma geração é ajudada pelos relatos da própria diretora em seu ambiente familiar. Ela é sobrinha de Marighella e se dedicou a retratar a história de um homem corajoso que carregava o ímpeto de despertar um povo por transformação social através do estímulo em descobrir a trajetória do carinhoso “tio Carlos” que se dedicava a carrega-la no colo antes de dormir.

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