Fábio Nassif - Carta Maior
São Paulo - Em meio a manchetes de jornais que apontam que a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) contrariou regras
internas e permitiu a venda de agrotóxicos mais prejudiciais à saúde, o
documentário O veneno está na mesa, exibido na 7ª Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul vem mostrar a sua duradoura atualidade.
O
filme de 50 minutos segue linguagem direta, com opinião explícita sobre
o assunto, como já é marca do diretor Silvio Tendler. É produto de uma
campanha contra o uso de agrotóxicos no Brasil que conta com apoio
direto do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), de uma
série de entidades e movimentos sociais.
Os dados colocados de
maneira pedagógica no documentário – como o de que os brasileiros
consomem em média 5,2 litros de veneno por ano – impactam não só em
decorrência da desinformação geral sobre a quantidade de agrotóxicos
contida nos mais variados alimentos disponíveis nas prateleiras de
supermercados, como também pela ausência de divulgação dos verdadeiros
impactos desses produtos à saúde humana.
Justamente por ser parte
de uma campanha, com posicionamento indiscutível contra o uso de
agrotóxicos, o filme surpreende pela quantidade e qualidade das
entrevistas conduzidas por Aline Sasahara.
São 70 no total,
sendo elas majoritariamente de agricultores – de variados municípios do
país -, o que também demonstra uma opção de ouvir aqueles que lidam
diretamente com a terra, que entendem dos perigos dos agrotóxicos e
também sofrem diretamente seus efeitos.
Sasahara conta que foi
impactante ver durante a coleta de depoimentos que “as pessoas têm
consciência de quanto estão se expondo, que estão multiplicando esses
produtos e que estão envenenando outros consumidores”. Mas a angústia é
não conseguir vencer esta lógica devido à pressão do agronegócio.
“Nós
fomos pra região do fumo, por exemplo, onde a realidade é absolutamente
devastadora, que merecia um outro filme” diz Sasahara, explicando que
não é somente sobre os produtos comestíveis que este problema versa.
Como a produção do fumo também é uma atividade tradicional, de cultivo
que envolve o conjunto das famílias incluindo crianças, o tema gera
inclusive discórdia entre seus membros sobre como enfrentar as empresas
que impõem a compra de um pacote de produtos químicos para viabilizar a
produção. “É uma situação de escravidão e as pessoas não conseguem
sair”, conclui.
Intercalado com imagens de defensores do uso de
agrotóxico, como a senadora Kátia Abreu (PSD), o documentário coloca em
confronto aberto os distintos projetos de desenvolvimento da agricultura
no país. De um lado os porta-vozes do agronegócio, de outro os
movimentos sociais, pequenos agricultores, intelectuais progressistas e
pesquisadores do assunto.
“Desde 2008, o Brasil é o maior
consumidor de agrotóxicos”, diz a abertura do filme. E já se sabe que
eles causam câncer, má formação do feto, depressão, problemas
hormonais, neurológicos, reprodutivos, no rim, doenças de pele,
diarréia, vômitos, desmaio, dor de cabeça e contaminação do leite
materno. É sob este estigma que toda uma geração cobaia, em nome do
“sucesso da agricultura”, viverá caso as políticas entorno do agrotóxico
não sejam revistas. E o filme contribui para que o país tenha melhor
noção sobre a dimensão desses perigos, não só aos seres humanos
diretamente, mas também ao meio ambiente.
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