02/10/2011

TEMOS NOSSO PRÓPRIO TEMPO (Marcos Aurélio Ruy)

Parece que o cinema brasileiro de certa linhagem pop anda procurando um caminho de atingir o grande público. Muitos filmes têm apresentado grandes bilheterias, inclusive, recentemente Tropa de Elite 2 bateu o recorde de público, que persistia desde 1976 e tirou do topo Dona Flor e Seus Dois Maridos.

A indústria do entretenimento, muito inspirada em Hollywood, procura encontrar um caminho para as grandes bilheterias, mesmo o cinema sendo tão caro e com a maioria das salas de exibição contidas em shoppings, deixando essa expressão artística ainda mais inacessível.

O cinema em todas as partes sempre contou com filmes de entretenimento e obras de autor, sendo que muitas vezes a linha divisória entre essas duas formas fica dificultada porque alguns filmes permanecem nesse limiar entre uma forma e outra e fica difícil enquadrá-lo aqui ou acolá. Caso da obra dirigida por Claudio Torres, O Homem do Futuro, uma ficção científica pop - novidade no cinema nacional -, que brinca com o tema tempo. Nenhuma novidade no tema. O que dá alento e joga a película na linha tênue das duas formas apresentadas pela arte cinematográfica, é a direção impecável, com efeitos especiais muito bem delineados e conteúdo inteligente, ao mostrar 20 anos de uma face da vida do país.

O filme começa em novembro de 2011, ou seja, nem chegamos lá ainda, por isso o título, e o protagonista Zero (Wagner Moura) retorna 20 anos no tempo com objetivo de “corrigir” um fato que, segundo sua visão, alterou o rumo de sua vida. Nenhuma novidade: o filme norte-americano De Volta para o Futuro, já abordou o tema, como várias outras produções hollywoodianas, mais ou menos competentes. Outro filme que vem a mente de todas as pessoas com quem conversei sobre a ficção brasileira é Efeito Borboleta, também de Hollywood.

Mas O Homem do Futuro brinca com a questão do tempo de ir e vir e inova quando coloca o mesmo personagem em três versões diferentes: o Zero de 1991, estudante, o professor universitário frustrado e infeliz e o “astronauta”. Cada um com opções divergentes de resolver o acontecido no passado e presente de um deles para mudar o futuro. E joga com opções de vida e de visões de mundo, do que ser deseja par ao futuro.

Tanto que o Zero “astronauta” já é o futuro alterado do passado modificado, que também retorna ao mesmo dia passado, porque não gostou do resultado da alteração efetuada e ele, apesar de muito rico, ficou sem sua amada, sem seus amigos um crápula capitalista e usurpador, se fosse Hollywood talvez parasse por aí, com é um filme nacional, ele resolveu voltar para que o passado se repetisse, aí está a novidade.

O filme deixa transparecer, talvez sem querer, mudanças que ocorreram no Brasil nos últimos anos. Mostra que a pesquisa científica e a educação tiveram grande avanço do governo Lula para cá, saiu do limbo e hoje está num patamar mais elevado e caminha para a solução dessa questão. Obviamente que ainda falta muito para aprimorar, mas já houve mudanças pertinentes.

Mas seria impensável em 1991 com Collor na Presidência ou em 1998 com FHC um filme que colocasse um cientista brasileiro como um gênio da ciência com possibilidades ímpares de pesquisa. Esse é o grande lance de O Homem do Futuro, uma comédia romântica com atuações brilhantes de Wagner Moura e surpreendentemente muito boa de Alinne Moraes, nada a ver com a atriz insossa das novelas globais.

O filme não se coloca a discutir a questão do tempo e de mundos paralelos filosoficamente, mas apresenta solução para a questão da ciência quando o Zero aborta toda a sua pesquisa que possibilitaria a viagem no tempo para que ninguém pudesse usar desse artifício para alterar o passado, deixando claro que o passado serve apenas como matéria de estudo para compreensão do presente e não repetindo os mesmo erros passados construirmos um futuro melhor.

No filme, vence o Zero “astronauta”, que trapaceia e consegue driblar o retorno ao presente, e também futuro, e mesmo com o fato passado ocorrendo igualmente, muda sua vida ao conscientizar a amada e uma amiga para saberem o que aconteceria e decidirem seus destinos com base nesse conhecimento. Nenhuma obra hollywoodiana Jam ais pensou em trapacear com o tempo, tão sagrado para eles.

O Homem do Futuro inova pela tentativa de conquistar o grande público sem apelar, com delicadeza, sentimento e inteligência. Com muito orgulho de ser brasileiro. Óbvio que o tempo não volta e isso não passa de ficção sem possível consecução, mas o filme se fia na música da banda Legião Urbana, tema do filme, e afirma que “temos nosso próprio tempo”.


Nenhum comentário:

Postar um comentário