09/10/2011

Não me solidarizo com Rafinha Bastos ( Marcos Aurélio Ruy)


 

Li recentemente ótimo e irônico texto de Marco Antonio Araujo no Blog do Miro, extraído do blog O Provocador, sobe o título “Minha solidariedade a Rafinha Bastos”, onde o articulista com fina ironia - como deveria ser a atitude dos bons humoristas – ataca os companheiros de programa desse dito “humorista” em suas digressões recentes que lhe causaram dissabor. 

Atrevo-me a discordar (já me desculpando pelo atrevimento) de Araujo apenas no aspecto da solidariedade, pois, entendendo o seu raciocínio e concordo com ele: de que para essa gente importa apenas o ganhar dinheiro a qualquer custo, discordo de que esse tal senhor mereça solidariedade, justamente porque, o próprio sabe bem a arena da qual faz parte e ele mesmo agiria como sues colegas de “trabalho”. 

O abuso, muito bem relatado no artigo mencionado, desses senhores já vem de longe e, cada vez mais, avançam no abuso do bom senso e da nossa inteligência.

Como verdadeiros “bobos da corte”, sabem muito bem que quando desagradam ao rei vem a degola e par agradar ao rei sempre vale tudo, desde a humilhar ilustres desconhecidos que na boa fé aceitam falar com eles nas ruas das cidades até a menosprezar e também tentar humilhar tudo o que beira ao popular no país, da política à cultura. 

Então que humor é esse na televisão brasileira e por que têm tão boa audiência? Isso sim muito preocupante. Será que a audiência é apenas por falta de opções para o lazer ou as pessoas concordam com esse tipo de coisa?

No caso mesmo do reincidente “humorista”, de quem não quero nem repetir o nome, há muito tempo ele vem falando absurdos e a platéia rindo, porque como diz o grande Gonzaguinha: “a plateia só deseja ser feliz”. 

No meu próprio ambiente de trabalho, sempre havia comentários e a maioria sempre a favor do dito “humor inteligente” feito pelo tal “CQC”, agora quando o sujeito mexeu com “amigos do rei” – e aí concordo plenamente com Araujo - todos o degolam, inclusive seus colegas da emissora e de outros órgãos da mídia, que o tempo todo lhes deu grandes destaques em suas páginas e programas televisivos e em rádios, inclusive na publicidade, inúmeras empresas colaram seus nomes a esses senhores sem escrúpulos para servir ao “rei”. 

Então a responsabilidade desse senhor ter chegado aonde chegou é de muita gente, porque a coisa vem de longe. Por isso concordo amplamente com o músico Tico Santa Cruz, dos Detonautas, quando ele diz que o maior problema do Brasil é a impunidade.

O indivíduo só chegou aonde chegou porque teve cobertura da emissora que o contratou, da mídia de uma forma geral e do público que lhe deu audiência e o aplaudiu rindo de suas “piadas” sem a menor graça. E isso não tem nada a ver com liberdade de expressão. Agora vou repetir um velho clichê, mas que não deixa de ser verdade: toda liberdade implica também em responsabilidade. Em qualquer setor da vida.

Voltando no tempo

Se olharmos para trás vê-se que a coisa vem de longe. Começou com a s tais “pegadinhas”, primeiro no SBT, salvo engano, onde atores simulavam pegadinhas em transeuntes, tudo muito mal disfarçado de que não passava de encenação, mas a plateia enganada ria. 

A audiência foi tamanha que o Faustão levou para o seu programa algo similar, as tais “vídeo cacetadas”, que tem até hoje, onde apresenta vídeos onde as pessoas passam por situações constrangedoras e a plateia continua rindo. 

Aí a coisa se propagou de tal forma que chegamos ao primeiro programa do tipo humilhar pessoas nas ruas e por vezes artistas em eventos. Entra em cena o mau-humor do “Pânico na TV”, da RedeTV!.

Antes ainda do “Pânico” tínhamos os maus-humoristas globais do “Casseta & Planeta”, da vênus platinada, com o mesmo teor de humilhar tudo o que tem próximo ao popular, sempre detratando o Brasil e seu povo, valorizando o estrangeiro europeu e norte-americano.

Mas o “Pânico” faz enorme sucesso na intelligentsia que o venerava, mas com vergonha de valorizar algo como diziam tão “vulgar”. Até entrar em cena o “CQC”, dando o argumento para esse pessoal poder rir dos mais pobres e do que é brasileiro: uma suposta “intelectualidade” dos integrantes desse programa.

Mas na verdade a diferença dos dois programas e seus similares está apenas na forma de apresentar o tal “humor” com uma disfarçada sofisticação.

Voltando ainda mais no tempo

Imitando o belo filme “O Homem do Futuro”, voltando ainda mais no tempo, pode-se saber que nem sempre foi assim o nosso humor.

Basta lembrar a inteligência do Barão de Itararé (Aparício Torelly), das décadas de 1920, 30 e subseqüentes, que com saborosas críticas faziam rir as pessoas. 

Também tivemos o Amigo da Onça, personagem criado por Péricles de Andrade Maranhão nos anos 1940, com enorme sucesso divertia a platéia com finas ironias rindo até de si mesmo, mas sempre com inteligência. 

E se falar ainda de Stanislaw Ponte Preta (codinome de Sérgio Porto), décadas de 1950-60, ilustrando nosso cotidiano com sabedoria em piadas que nos retratam tão bem. 

E o jornal “O Pasquim”, Millôr Fernandes, Henfil e outros, que hoje estão largados às traças, prevalecendo o mau-humor atual. 

E esses verdadeiros humoristas citados nunca cederam aos poderosos e nos fizeram rir, sem perder de vista a liberdade de expressão e também a responsabilidade pelo que escreviam ou diziam.

Retornando ao presente

Os programas de tevê ditos de humor faz algum tempo, vêm detratando as questões sociais e as chamadas minorias com descaso sem iguais. 

E instaurou-se o vale tudo para fazer sucesso, com tem-se o vale tudo pra qualquer furo jornalístico. E digo isso, porque alguns telejornais mais se assemelham a programas de “humor” do que a jornalismo. E tudo vale pelo show. 

Tudo é espetacularizado. Da dor da perda de entes queridos a supostas acusações, mesmo sem comprovação de determinados crimes de corrupção. Vale tudo pra levar a plateia ao delírio e atingir picos de audiência a qualquer custo.

O preconceito sempre presente de programas matinais que apresentam a nossa cultura como inferior a de outros países, sempre os do Primeiro Mundo, óbvio. 

Como no caso de Ana Maria Braga, apresentadora da Globo, que mostrou em seu programa numa manhã dessas em que eu estava em consultório esperando minha vez, japoneses parados num semáforo de trânsito por cerca de dois a Três minutos esperando o semáforo dar-lhes sinal verde, mesmo sem passar nenhum carro nesse tempo todo. E sem ver as diferenças culturais entre Brasil e Japão, a apresentadora afirma que “aquilo que é civilização”, atacando os brasileiros por não agirem dessa forma. E esse programa matinal nem é de “humor”.

Usei esse exemplo apenas para ilustrar a que até mesmo a questão dos programas de humor, que não é só na televisão, pois no rádio já ouvi programas que passavam trotes telefônicos em pessoas e nunca forma proibidos, a questão de tudo isso está na impunidade, como com razão afirmou o músico Tico Santa Cruz no Rock in Rio, e também na falta de regulamentação e de democracia da comunicação no Brasil. 

Por isso não me solidarizo com Rafinha Bastos, porque ele deve ser responsabilizado por seus atos e dever responder por isso, assim como a sua contratante a Band e os dirigentes e seus “companheiros” (grandes companheiros) do “CQC”. 

Os órgãos competentes têm que tomar providências. Basta de impunidade. E isso não tem nada de censura, porque ele teve a liberdade de dizer o que disse, agora deve responder por isso. Ele e seus colegas. Portanto, regulamentação já em todos os níveis. E até mesmo os bobos da corte do atual dito “humor” que não passa de mau-humor de tão ranzinza, bobos da corte de todas as emissoras.

Finalmente, não me solidarizo com Rafinha Bastos porque ele faz parte dessa turma que para agradar ao patrão fala mal do Brasil, da cultura e do povo brasileiros. 

Para agradar ao patrão fala mal dos defensores dos direitos humanos, das crianças, dos adolescentes, dos idosos, dos negros, das mulheres, dos homossexuais, dos pobres, dos índios, dos blogueiros progressistas, dos defensores da democratização dos meios de comunicação. 

Para agradar ao patrão falam mal do ex-presidente Lula, da presidenta Dilma, do Congresso nacional, do PT, do PCdoB, do MST, dos políticos. 

Para agradar ao patrão falam mal de tudo e de todos que desagradam ao patrão.

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