Por Iury Paulino - de Belém
Na semana passada, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social) aprovou o financiamento de R$ 22,5 bilhões para a
Norte Energia S/A construir a barragem de Belo Monte, no rio Xingu (PA).
O empréstimo é o maior da história do banco, três vezes maior que o
segundo colocado, os R$ 9,7 bilhões destinados à refinaria Abreu e Lima,
em Pernambuco. Além disso, representa 80% dos R$ 28,9 bilhões previstos
para a construção da obra.
A maior parte desse dinheiro virá do bolso dos próprios brasileiros,
pois o BNDES depende cada vez mais de recursos do Tesouro Nacional, ou
seja, do dinheiro arrecadado dos impostos pagos pelos cidadãos, para
bancar empréstimos como este. De acordo com o jornalValor Econômico,
de janeiro de 2009 até hoje, os repasses do Tesouro ao banco estatal
responderam por mais da metade (51,4%) dos R$ 538,2 bilhões
desembolsados pelo BNDES no período.
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) questiona: quem é que
vai pagar esse empréstimo? Esse valor, como sabemos, será repassado para
as contas de luz. Enquanto isso, os beneficiados serão as grandes
construtoras – Andrade Gutierez, Camargo Correa, Queiroz Galvão e
Odebrecht, três grandes empresas de máquinas e equipamentos – Voith,
Alstom e Andriz – e seguradoras envolvidas no Consórcio Construtor de
Belo Monte (CCBM).
A venda da energia, por sua vez, nos 30 anos de contrato de concessão
da barragem, vai gerar um faturamento acima de R$ 100 bilhões. Os
beneficiários desse montante serão as empresas que formam a sociedade
dona da barragem, a Norte Energia: a Iberdrola, a Vale, a Cemig, fundos
de pensão e parte da Eletrobras. A estatal, por sua vez, também ficará
com o prejuízo de cerca de R$ 500 milhões por ano referente à parcela da
energia do mercado livre.
Ou seja, enquanto a população brasileira paga a conta, as empresas lucram com a apropriação dos rios e da energia.
E pagando a conta, o que resta para a população? Até agora, a
construção de barragens no Brasil tem deixado um legado de violação de
direitos humanos. O caso de Belo Monte, que deverá ser a 3ª maior usina
do mundo, atrás apenas de Três Gargantas e Itaipu, não é diferente:
somente na cidade de Altamira, mais de 30 mil pessoas terão de deixar
suas casas no próximo ano, e ainda não tem garantia de reassentamento.
Mais de 30 povos indígenas são afetados, segundo o Conselho Indígena
Missionário. Os pescadores, que dependem do rio para sua sobrevivência,
não são reconhecidos como atingidos. Na região, as ocorrências policiais
aumentaram, a especulação imobiliária atingiu níveis semelhantes a
grandes metrópoles, há pressão sobre os sistemas de educação, saúde e
transporte, além da degradação do bioma amazônico. E as obras das
condicionantes – para as quais foi destinada a quantia de R$ 500
milhões, muito pequena perante os valores da obra – estão
reconhecidamente atrasadas.
Por esses e outros motivos, Belo Monte é alvo de 15 ações civis
públicas do Ministério Público Federal. Também já foi multada pelo Ibama
em R$ 7 milhões no início deste ano. Esses fatos são desconsiderados
pelo BNDES, que, em tese, só pode financiar obras que estão regulares
perante a Justiça e os órgãos do meio ambiente.
Belo Monte é mais uma ação de violação dos direitos humanos e
ambientais na Amazônia brasileira, financiada com dinheiro público, sem
nenhuma restrição ou preocupação com os problemas que esta obra já
causou, está causando e virá a causar. A dívida histórica do Estado com
os atingidos pelo setor vai crescendo e acrescentando novos credores.
Iury Paulino faz parte da Coordenação Nacional do MAB no Pará.
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