22/11/2012

Dilma constrange a União Europeia com declaração sobre ‘excessos’ da mídia no Brasil


Por Gilberto de Souza - Correio do Brasil
A presidenta Dilma Rousseff precisou viajar até a Espanha, um dos pilares da União Europeia, para mandar de lá uma daquelas ‘batatadas’ das quais o Brasil poderia, perfeitamente, prescindir. A questão do bullying midiático do qual a mandatária brasileira é vítima, diga-se, já foi assunto aqui no Correio do Brasil desde quando ela assumiu que “a imprensa brasileira comete excessos com frequência”, mas que prefere o mau caratismo generalizado “ao silêncio da ditadura”. Ocorre, porém, que os espanhóis não admitem nem uma coisa, traduzida nos tais ‘excessos’ de um grupelho rico e golpista que domina a mídia nacional, nem a outra, a ditadura promovida por essa turma nos idos de 1964, época na qual a outrora e saudosa guerrilheira foi capturada pelos mesmos algozes.
Os britânicos também não admitem uma coisa dessas, tanto que colocaram abaixo o império secular de um dos tubarões da mídia internacional. Diferentemente daqui, onde o sujeito que dirige uma revistinha fascista mantinha ligações perigosíssimas com o chefe de uma quadrilha e sequer é convidado a depor no Parlamento, os parlamentares ingleses colocaram um na cadeia e fecharam o jornal do manda-chuva. Os franceses, menos ainda. Os alemães, nem pensar. Lá, onde Dilma pensou estar abafando ao afagar os cães que a acuam no corner do noticiário, o Parlamento Europeu editou, há quatro anos, uma resolução muito parecida com a Lei dos Meios, recentemente sancionada aqui, na vizinha Argentina. Nossos hermanos, nesse ponto, estão anos-luz distantes do acinte em curso no Brasil.
Dilma, certamente, fez ouvidos moucos aos bem pagos conselhos de sua assessoria que, se faz valer tudo o que ganha, deve tê-la alertado que todos os países da Europa são signatários da Resolução do Parlamento Europeu, de 25 de Setembro de 2008, sobre a concentração e o pluralismo nos meios de comunicação social na União Europeia. Trata-se do documento que rege o relacionamento entre os Estados daquele continente e a liberdade de imprensa e das empresas, de forma a preservar a diversidade e evitar a concentração de poder nas mãos de alguns apaniguados, a exemplo do que se vê aqui, neste lado do Atlântico.
Como questionou o insuspeito jornalista Paulo Nogueira a partir de Londres, de onde escreve o seu Diário do Centro do Mundo, “a declaração de Dilma é um esforço diplomático, é certo, mas ela é essencialmente infeliz. Se ela reconhece ‘os excessos da mídia’, o que ela pensa fazer para enfrentar o problema, em nome do interesse público? Ou será que ela pretende apenas constatar o caso?”. Mais do que apenas constatar, sequer se informou sobre as soluções encontradas para questões semelhantes, no local onde estava para uma entrevista ao conservador diário espanhol El País. Quem agendou essa armadilha deve ter sido a mesma assessoria que lhe garantiu a capa da revista semanal de ultradireita Veja, não faz muito tempo. As digitais parecem ser as mesmas.
Ainda segundo Nogueira, diante dos tais excessos praticados pela mídia golpista nacional, “admiti-los e não fazer nada tem um nome: omissão. Ou, numa visão um pouco mais severa, covardia”. Mas aí é preciso fazer uma ressalva. A falta de coragem para enfrentar o rolo compressor das co-irmãs, seja na hora do jantar ou numa banca perto de você, não seria apenas da presidenta, mas do Congresso também, hipnotizado cada vez que uma câmera é ligada ou lhe estouram um flash pelas fuças. Tal qual o Planalto, este poder da República abstrai da vontade política de enfrentar o arrivismo que assombra o país, sempre às vésperas das eleições ou quando apertam os calos dos donos do poder econômico na comunicação social brasileira.
Na Resolução, a União Europeia confirmou o seu “empenho na defesa e na promoção do pluralismo dos meios de comunicação, enquanto pilar essencial do direito à informação e da liberdade de expressão, consagrados no artigo 11º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e que constituem princípios fundamentais para a preservação da democracia, do pluralismo cívico e da diversidade cultural”. E, para garantir esta diretiva, instou a Comissão e os Estados-Membros a “salvaguardarem o pluralismo dos meios de comunicação, a assegurarem o acesso de todos os cidadãos da UE a meios de comunicação social livres e diversificados e a recomendarem melhorias, quando necessário”.
Se apenas estes dois artigos estivessem em vigor, aqui no Brasil, escândalos como a Proconsult da Rede Globo, no passado, e sua recente versão nas eleições para a prefeitura paulista, com a divulgação de resultados suspeitos de pesquisas de opinião do instituto de propriedade do diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, sequer teriam como existir. Sem falar na baixaria transcrita nas capas dos jornalões ou nos horários nobres das tevês acumpliciadas, durante as últimas eleições presidenciais.
Na Europa, de onde partiu a declaração mal informada da presidenta, o Parlamento Europeu observou que “a evolução do sistema mediático é cada vez mais orientada para o lucro” e, consequentemente, “os processos societários, políticos ou econômicos, assim como os valores consagrados nos códigos de conduta dos jornalistas não estão convenientemente salvaguardados”. Diante deste fato, os europeus consideraram, assim, que “o direito da concorrência deve estar interligado com o direito da comunicação social, a fim de garantir o acesso, a concorrência e a qualidade e de evitar conflitos de interesses entre a concentração da propriedade (…) e o poder político, que são prejudiciais para a livre concorrência, a equidade ao nível da atividade e o pluralismo”.
A turma de olhos azuis até parece conhecer bem demais a realidade brasileira, e trataram de evitá-la.

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