22/09/2011
“Foi bonita a festa, pá!” Podemos estar contentes
com a aprovação da Comissão Nacional da Verdade pela Câmara de
Deputados ontem. Consagrou o método de combinar acordos políticos com
mobilização popular. E esta demonstrou como os artistas e intelectuais
continuam demonstrando uma grande sensibilidade para as maiores causas
nacionais.
O que conquistamos foi a aprovação da Câmara e, quando
tivermos a do Senado, teremos conquistado apenas um passo inicial: a
construção de um espaço de busca da verdade sobre o que ocorreu durante a
ditadura militar e a versão oficial do Brasil sobre o que ocorreu
naquele período. Foi uma construção política, que abre um importante
espaço de disputa. Agora se trata da aprovação no Senado e da composição
da Comissão.
O projeto requer reparos, de vários pontos de
vista, mas uma parte das objeções levantadas não tem fundamento. O
primeiro problema é a extensão no tempo, retrocedendo a 1946. É certo
que essa é uma data de origem das articulações golpistas que
desembocaram em 1964, depois de várias tentativas de dar o golpe - 1954 e
1961, entre outras. Foi naquele momento que os oficiais das FFAA
regressando da participação na guerra na Itália, passaram a ser
influenciados diretamente pela oficialidade norteamericana. Em concreto,
Golbery do Couto e Silva – que posteriormente seria peça chave na
articulação do golpe e em governos da ditadura – fundou a Escola
Superior de Guerra, desde onde se difundiu a nefasta Doutrina de
Seguranca Nacional, que orientou as ditaduras do continente, no espírito
da guerra fria, conforme a visão norteamericana.
Porém, as
violações dos direitos humanos, como as entendemos, se concentraram
claramente – tornando-se uma política de Estado – a partir de 1964 e ao
longo de todo o período ditatorial, sobre o qual a Comissão deveria
concentrar-se. Ainda mais que ela não tem uma duração muito longa – 2
anos – e nao dispõe, pelo menos inicialmente, de recursos próprios para
trabalhar. Mas isso a Comissão pode redimensionar no seu programa de
trabalho, para não desconcentrar-se do centro mesmo das suas
investigações.
Quanto ao acesso a documentos e informações, a
Comissão terá amplos direitos de requisitá-los de órgãos ou entidades do
Poder Público, mesmo os que são classificados em qualquer grau de
sigilo. Além disso, a Comissão poderá convocar, de forma obrigatória, as
pessoas para prestarem esclarecimentos sobre as violações dos direitos
humanos. Uma emenda posterior ampliou ainda mais as fontes de que vai
dispor a Comissão, porque agrega que qualquer pessoa que considere que
tem informação relevante a prestar para esclarecer essas violações, pode
solicitar ser ouvida pela Comissão.
Quanto aos recursos, a Casa
Civil da Presidência dará o suporte técnico, administrativo e financeiro
necessários para as atividades da Comissão.
Em relação à objeção
do número relativamente limitado de membros da Comissão – sete -, e’
preciso levar em conta que, além do fato de que serão criados 14 cargos
em comissão para assessor os trabalhos da Comissão, ela se apoiará em
grande quantidade de entidades que têm desenvolvido, há muito tempo,
pesquisas sobre o tema.
Mas mesmo em comparação com Comissoes de
outros países, constatamos que no Chile ela teve 8 membros, na
Argentina, 13, na Guatemala e em El Salvador 3 e no Peru, 12. O que
revela que a composição brasileira se ajusta ao número de membros dos
outros países.
Quanto aos critérios da nomeação dos seus membros,
foram aprovados critérios que excluem a possibilidade de participação
de pessoas com cargos políticos públicos, com mandatos ou que tivessem
estado diretamente vinculados ao fatos analisados.
Quanto à
duração, a Comissão poderá dispor de grande quantidade de pesquisas e
acervos acumulados nas ultimas décadas, seu trabalho não começará do
zero.
Assim, o que foi conquistado é um espaço para a busca e
sistematização das informações que permitam esclarecer, com o máximo de
rigor possível, as violações dos direitos humanos durante a ditadura
militar e formular a narrativa oficial do Estado brasileiro sobre a
ditadura militar que vitimou o país de 1964 a 1985. Um primeiro e grande
passo, que rompe a inércia em que estávamos antes dessa iniciativa. Só
podemos saudá-la, apostar no seu trabalho e mobilizar-nos para que ela
cumpra da melhor forma possível seus objetivos, assim que for aprovada
pelo Senado e sancionada pela Presidência.
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